Cansados do tratamento preconceituoso e violento por parte das autoridades policiais durante abordagens e blitz, os moradores da periferia resolveram reagir e se prevenir. O Fórum Grita Baixada, surgido em 2012 de uma união de forças de movimentos sociais, instituições, igrejas, cidadãos e cidadãs da Baixada Fluminense, está divulgando o "Manual para Vítimas da Violência Institucional: O que fazer quando o Estado viola os seus direitos?", produzido no ano passado pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), do Ceará.
Segundo o Cedeca, o Manual ajuda a identificar a violência institucional a partir de situações e exemplos; informa sobre medidas para se proteger antes, durante e depois da denúncia da violação; e, finalmente, orienta sobre quais locais podem receber a denúncia. Lembra o Cedeca: "O Estado está sujeito ao controle social, devendo a sociedade cobrar do poder público o que lhes é de direito. Dessa forma, os funcionários das instituições públicas têm na lei o limite para sua atuação, não podendo agir para além do que a lei permite nem deixar de fazer o que a lei determina", afirma a entidade. As orientações são baseadas na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Já virou fato corriqueiro nas operações policiais em comunidades ou mesmo no asfalto, revistas em determinadas pessoas, seja pela cor da pele ou algum tipo de roupa ou mesmo vistorias no veículo em que a pessoa se locomove, como bicicletas, por exemplo, sem que haja qualquer suspeita razoável de que a pessoa esteja carregando algo indevido. Notório que as pessoas negras são alvos preferenciais de revistas policiais, inclusive em blitz.
Quando as abordagens forem nas ruas, o Manual recomenda: Saber a identificação dos policiais ou guardas que estão fazendo a intervenção, os nomes devem estar em lugar visível; ser revisitado apenas por agentes do mesmo sexo que a pessoa; não ter os pertences apreendidos, sem justificativa ou acusação formal; não ser submetido a tratamento degradante ou tortura; é possível filmar ou fotografar as ações policiais, uma vez que eles são agentes públicos.
Além disso, a revista do corpo deve se limitar a procura de objetos ou armas, é proibido que os policiais "passem a mão" nas partes íntimas, especialmente de mulheres. Se isso ocorrer configura abuso de autoridade e crime contra a dignidade sexual da pessoa abordada. A abordagem não autoriza que os policiais ou guardas constranjam as pessoas que são abordadas: eles não podem gritar, xingar ou ameaçar as pessoas, visto que isso também configura crime de injúria, difamação ou calúnia ou mesmo crime de ameaça.
Moradores de comunidades cariocas já fizeram diversas denúncias nas redes sociais de invasões de residências por policiais sem nenhuma autorização ou explicação. Ocorre sempre durante operações da Polícia Militar. Porém, segundo a Constituição, a casa é um asilo inviolável do cidadão e que, portanto, ninguém pode entrar sem autorização dos moradores. A violação do domicílio é crime. Apenas em casos de desastre ou para prestar socorro, é possível entrar em uma casa sem autorização do morador.
No estado do Rio, a partir da intervenção federal na área da segurança pública, há um mandato coletivo que permite entrada de policiais em residências para vistorias e outras operações policiais.
Fora isso, os agentes do Estado também tem permissão legal para ingressar na casa das pessoas quando tiverem fundada suspeita de flagrante de crime ou ato infracional acontecendo no interior da residência. Se o morador autorizar, a Polícia pode ingressar na casa a qualquer hora. No entanto, essa autorização não pode ser conseguida mediante ameaças.
A autorização judicial para ingressar nas casas das pessoas precisa ser específica, pode ser um mandado de busca ou apreensão, que é utilizado para garantir o recolhimento de algum objeto ou para apreensão de adolescente acusado de cometer ato infracional, ou mandado de prisão que é apenas para adultos. A ordem deve ser apresentada antes da entrada na casa e deve conter o endereço correto, o motivo da busca ou a pessoa buscada, bem como a assinatura do juiz responsável.
Outra orientação do Manual é em relação às manifestações nas ruas. "Entre as violações verificadas, muitos agentes policiais seguem sem a devida identificação, impossibilitando seu reconhecimento e propiciando condições para o cometimento de ações arbitrárias de violência. Além disso, o uso das chamadas armas menos letais, como gás lacrimogêneo e spray de pimenta deve obedecer aos critérios da necessidade e da proporcionalidade, não podendo ser utilizado de maneira aleatória pelos efeitos danosos à saúde e pela violação à livre manifestação. Caso configurado abuso de poder ou alguma outra ilegalidade por agentes públicos contra pessoas manifestantes, isso deve ser denunciado para os órgãos competentes".