A política nacional é o tema de hoje do nosso “Desafio dos Dez Anos”. Para entendermos como os agentes faziam política em 2009 e como eles agora estão se relacionando, politicamente falando, o portal entrevistou o cientista político Ivo José de Aquino Coser, que também é coordenador do curso de Bacharelado de Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Parece que, em 2009, a relação que se desenvolvia entre os poderes do Executivo e do Legislativo era mais amistosa, com o governo conseguindo aprovar a maioria das suas propostas. Como isso funcionava de fato?
Ivo Coser - Muito antes de 2009, mais precisamente desde o governo FHC (ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de 1995-2003), o Executivo articulava com os líderes da Casa. Ou seja, muitos antes das propostas serem enviadas à Câmara, o governo conversava com as lideranças dos partidos políticos de maior peso, que formavam uma espécie de Colégio de Líderes Partidários.
Esse era o principal instrumento que o governo se utilizava para aprovar as suas propostas?
- Quando essas matérias chegavam à Câmara, elas já estavam praticamente aprovadas por esse Colégio de Líderes. Havia, então, uma relação de previsibilidade entre o Executivo e o Legislativo. Essa forma de governar foi seguida pelos governos que sucederam FHC, inclusive os petistas, até a ascensão do ex-deputado Eduardo Cunha , como presidente da Câmara.
Qual foi a interferência de Cunha nesse processo?
- Com a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, em 2015, essa forma do Executivo se relacionar com o Legislativo, em especial com a Câmara, mudou radicalmente. Esse Colégio de Líderes parou de atuar e quem pautava a agenda política nacional era Cunha.
O que mudou, então?
- Hoje, temos um Congresso Nacional muito fragmentado. Aliás, o Congresso brasileiro é o mais fragmentado do mundo. Isso torna a relação entre os poderes Executivo e Legislativo muito mais difícil.
As investigações de combate à corrupção que surgiram no país, primeiro com o Mensalão e depois com a Lava Jato, influenciaram de alguma forma na política nacional?
- Para o bem ou para o mal, o Mensalão e a Lava Jato certamente mudaram a forma de fazer política no país. Essas investigações atingiram, em cheio, os partidos políticos, empresas e agentes públicos. Criou-se a partir daí, uma nova forma de se fazer política no Brasil.
É possível fazer um prognóstico de como será o governo Bolsonaro?
- Como o governo de Bolsonaro irá se comportar ainda é uma incógnita para todo mundo. Diferentemente do governo Collor (ex-presidente Fernando Collor de Mello, que governou entre 1990 a 1992 e renunciou), Bolsonaro possui um apoio da sociedade mais forte do que Collor possuía na época. Bolsonaro possui uma base de apoio mais ativa. Mas, apesar disso, ainda há dúvidas de como será a atuação desse governo que está iniciando.
As denúncias contra o filho do presidente da República, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), podem atrapalhar ou até prejudicar o atual governo?
- Sim, é claro que podem causar danos ao governo Bolsonaro. Mas temos que aguardar os desdobramentos desse caso para termos um quadro mais claro dessa situação.
Nas últimas eleições nacionais, nos deparamos com o poder das redes sociais, que ajudaram a eleger um presidente da República o qual, durante a campanha, era considerado uma espécie de outsider na política. As redes sociais são uma nova forma de fazer política no Brasil?
- As redes sociais, certamente, mudaram a forma de se fazer política no Brasil. Antes, apenas a mídia impressa, televisiva e de rádio, além do tempo de propaganda eleitoral que cada partido tinha, influenciava sobremaneira na escolha dos governantes. Hoje, não. As redes sociais assumiram esse papel. Elas foram fundamentais na vitória de Bolsonaro e continuarão sendo nas próximas eleições.
E qual deverá ser a relação do governo atual com o Poder Legislativo?
- No Brasil, todo o governo é de coalizão. No Legislativo, há representantes de viés ideológicos diversos e de interesses distintos, como os de centro, de direita, de esquerda, pragmáticos, etc. Todo governo inicia sem saber ao certo com quem se aliar. Mas chega um momento em que o governo se decide e passa a seguir uma linha ideológica. Por enquanto, não sabemos qual a agenda que irá prevalecer no atual governo. Ou seja, se essa agenda será do agronegócio, dos evangélicos ou do grupo da “bala”. Ninguém sabe ainda.