O ex-presidente da Philips Medical Systems no Brasil e atual presidente e CEO da GE para a América Latina, Daurio Speranzini Júnior, e o executivo da Philips Frederik Knudsen foram presos hoje pela Operação Ressonância, deflagrada pelo Ministério Público Federal em conjunto Com a Polícia Federal, a Controladoria Geral da União e o Tribunal d Contas da União. Além dos dois executivos foram detidos outros 20 suspeitos de integrar um esquema de fraudes em licitações e contratos para venda de equipamentos médicos e hospitalares para o do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad (Into) e a Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro.
A 7ª Vara Federal Criminal autorizou a prisão preventiva de 13 pessoas e a temporária de nove, além da busca e apreensão em 44 endereços. O juiz Marcelo Bretas decretou também o bloqueio de bens dos investigados no valor de R$ 1,2 bilhão. Em entrevista coletiva no início da tarde, o Ministério Público informou que em nove contratos analisados, as fraudes no Into propiciaram o desvio de R$ 420 milhões dos cofres públicos. Na Secretaria Estadual de Saúde, foram desviados R$ 47 milhões foram desviados da Secretaria Estadual de Saúde. O Tribunal de Contas da União (TCU) exige a devolução de R$ 85 milhões aos cofres públicos.
De acordo com a Agência Brasil, Bretas também determinou a intimação do ex-secretário de Saúde do Rio, Sergio Côrtes. Ele, contudo, não foi encontrado em sua residência na Lagoa, zona Sul da Cidade. Preso em abril do ano passado, Côrtes obteve do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes um habeas corpus em fevereiro deste ano, por decisão monocrática, isto é, sem consulta ao plenário ou aos demais ministros da Segunda Turma do STF, integrada por Gilmar.
A Procuradoria afirmou ter reunido provas robustas contra os acusados. As investigações apontaram crimes de corrupção, fraude a licitações e organização criminosa. Amparados por um documento de 362 páginas em que sustentaram o requerimento da prisão dos envolvidos, os procuradores da Força-Tarefa da Lava Jato no Rio acusaram os "principais executivos de fabricantes multinacionais de equipamentos médicos" de atuar por de acordos que excluíram concorrentes potenciais e direcionavam o resultado das licitações por meio de propina e vantagens indevidas a servidores públicos.
De acordo com a Agência Brasil, os agentes da operação cumpriram mandados de busca e apreensão em 44 diferentes endereços, inclusive prédios da Philips e da Johnson & Johnson do Brasil. Tendo realizado, ainda, a prisão do supervisor de vendas da Philips à época dos fatos investigados, e atual gerente de contas estratégicas da empresa, Frederik Knudsen.
Fatura Exposta debilitou esquema e abriu caminho para operação
As investigações da operação Fatura Exposta, ano passado, identificaram um grupo de fornecedores que atuou como cartel no Into por mais de vinte anos, entre 1996 e 2017. O empresário Miguel Iskin, dono da companhia Oscar Iskin, transformou sua empresa na cabeça de um cartel de pelo menos, 33 outras sociedades. Parte dessas era laranja das principais, organizadas como "clube do pregão internacional".
O núcleo operacional da organização era integrado por homens de confiança da Oscar Iskin, responsáveis pela ligação entre o setor público (núcleo administrativo-político) e os empresários cartelizados (núcleo econômico). Essa aproximação visava para direcionar as demandas públicas (insumos médicos a serem adquiridos e cotação de preços fraudados) e as contratações. O principal instrumento para esse fim era desclassificação ilícita de adversários do cartel.
Na petição, acolhida por Marcelo Bretas, a Força-Tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro detalha o 'modus operandi' do esquema investigado: "Esses atos de ofício eram comprados com o pagamento de vantagens indevidas milionárias, as quais eram custeadas com base na arrecadação de valores com as empresas beneficiárias das licitações, seja por meio de pagamento de 'comissões' no exterior (correspondentes a cerca de 40% dos contratos), seja por meio do recolhimento no Brasil de valores entre 10% e 13% dos contratos firmados pelas empresas do cartel, estratégia que gerava um 'grande caixa de propina' administrado por Miguel Iskin de forma a retroalimentar o sistema e permitir a sua hegemonia no mercado da saúde pública durante décadas." A petição é assinada pelos procuradores da República Eduardo El Hage, Fabiana Schneider, Marisa Ferrari, José Augusto Vagos, Leonardo Cardoso de Freitas, Rafael Barretto, Rodrigo Timóteo, Stanley Valeriano, Sérgio Pinel, Felipe Bogado e Almir Teubl Sanches, todos integrantes da força-tarefa.
As investigações da Operação Fatura Exposta, base da Operação Ressonância, resultaram na acusação de pagamento de propina ao ex-governador Sergio Cabral e ao ex-secretário de Saúde Sergio Côrtes. Cabral foi acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de receber R$ 16,4 milhões da empresa de materiais médicos Oscar Iskin, em repasses mensais de até R$ 450 mil por mês.
A Procuradoria da República no Rio de Janeiro informou que Cabral receberia 5% do esquema de fraudes na compra de equipamentos médicos e próteses. As acusações se estendiam ao ex-secretário de Saúde Sergio Côrtes e os empresários Miguel Iskin e Gustavo Estellita, conforme reportagem da Agência Brasil, que reproduz documentos oficiais do MPF.
O ex-secretário de saúde, primeiro diretor do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad (Into), e os dois empresários foram alvo de mandados de prisão preventiva no âmbito da Operação.
Esquema era sofisticado e se baseava na exclusão de concorrentes por agentes públicos que recebiam propina regularmente
O documento divulgado pelo Ministério Público Federal, logo que foi deflagrada a Operação Ressonância, detalhou os diferentes níveis de atuação do esquema criminosos: "No núcleo administrativo da organização criminosa, destaca-se a atuação de Jair Vinnicius Ramos da Veiga, conhecido como Coronel Veiga, responsável por controlar de fato as licitações no Into e na Secretaria Estadual de Saúde. O esquema de corrupção no Into permaneceu, mesmo após as mudanças nos cargos de direção, envolvendo o atual diretor-geral do Into, André Loyelo, e o coordenador de administração geral, Luís Carlos Moreno, os quais continuaram os ajustes com empresas contratantes, incluindo algumas integrantes do cartel," acusa o documento do MPF.
A peça detalha ainda a atuação do chamado núcleo econômico. Nele, de acordo com que diz textualmente o MPF, alguns dos principais executivos de multinacionais de equipamentos médicos, combinavam o resultado das licitações mediante o pagamento de comissão a Miguel Iskin, correspondentes até 13% dos contratos.
Companhias intermediárias controladas por Iskin atuavam no cartel para vender produtos fabricados por terceiros. As empresas laranjas tomavam parte das licitações para dar aparência de legalidade ao certame. Quando ganhavam o contrato, retinham uma pequena parte como comissão e virtual totalidade das vendas era repassada para os grandes fabricantes.
Para o recebimento dos valores, Miguel Iskin montou uma rede complexa de lavagem de dinheiro, utilizando-se de offshores em diversos países e empresas no Brasil. O esquema funcionava de maneira similar na Secretaria de Saúde, onde se identificou fraude em licitações realizadas diretamente, como a que gerou os contratos de reforma e aquisição de equipamentos para a sede do Instituto Estadual do Cérebro (IEC), além da adesão a atas de registro de preço do Into nas quais também foram encontradas irregularidades.
Foram determinadas as prisões temporárias de:
1. Luiz Sérgio Braga Rodrigues
2. Márcia de Andrade Oliveira Cunha Travassos
3. Albert Holzhacker
4. Frederik Knudsen
5. Daurio Speranzini Júnior
6. Ermano Marchetti Moraes
7. Julio Cezar Alvarez
8. Daniele Cristine Fazza da Veiga
9. André Luiz Loyelo Barcellos
Também foram decretadas as prisões preventivas de:
1. Miguel Iskin
2. Gustavo Estellita
3. Marco Antônio Guimarães Duarte de Almeida
4. Marcos Vinicius Guimarães Duarte de Almeida
5. Gaetano Signorini
6. Wlademir Rizzi
7. Adalberto Rizzi
8. Antônio Aparecido Georgete
9. Ivan Console Ireno
10. Jair Vinnicius Ramos da Veiga
11. Luis Carlos Moreno de Andrade
12. João Batista da Luz Júnior
13. Rafael dos Santos Magalhães
Advogado do ex-governador Sergio Cabral nega envolvimento de ex-governador; multinacionais prometem colaborar com as investigações e negam participação em irregularidades.
O escritório de advocacia que defende o ex-governador Sergio Cabral argumentou que a Operação Ressonância investigou órgãos federais e contratos de um período em que Cabral já deixara o posto. O requerimento do MPF à 7ª Vara da Justiça Federal, contudo, arrola dados investigados no âmbito da Operação Fatura Exposta, que resultou em acusações formais contra Cabral e seu então secretário de Saúde, Sergio Côrtes.
As empresas multinacionais que tiveram executivos citados no âmbito da Operação Ressonância divulgaram notas oficiais em tom sóbrio. Em nota citada pela Agência Brasil, a Johnson & Johnson Medical De vices Brasil disse que "segue rigorosamente as leis do país e está colaborando integralmente com as investigações em andamento".
A GE, por seu turno. admitiu a prisão temporária de seu executivo, alegando no entanto que se referem a um período em que ele dirigia outra companhia. A Philips, por sua vez, informa não ter tido acesso ao processo e enfatizou que seus atuais dirigentes não são alvo de investigação. Segue a íntegra das duas notas:
GE
A GE confirma a prisão temporária de Daurio Speranzini Jr., como parte de uma investigação em curso pela Polícia Federal. As alegações referem-se a um período em que o executivo trabalhou para uma companhia sem relação com a GE. A empresa reforça que está profundamente comprometida com integridade, conformidade e o estado de direito em todos os países em que opera, assim acredita que os fatos serão esclarecidos ao longo da investigação.
Philips
A Philips informa que ainda não teve acesso ao processo, no entanto, está cooperando com as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos quanto às alegações apresentadas, que datam de muitos anos atrás. Os atuais líderes executivos da Philips não são parte da ação da Polícia Federal; um colaborador da equipe de vendas da Philips foi conduzido para prestar esclarecimentos. A política da Philips é realizar negócios de acordo com todas as leis, regras e regulamentos aplicáveis. Quaisquer investigações sobre possíveis violações dessas leis são tratadas muito seriamente pela empresa