Educador acende alerta para prejuízos em inovação, competitividade e produtividade; somente nos primeiros oito meses do ano, brasileiros gastam cerca de R$ 20 bilhões em jogos on-line, segundo dados do BC
Quando o tema é a juventude, uma das maiores preocupações nacionais da atualidade é o volume expressivo de apostas em jogos on-line, as chamadas de "bets". Esse cenário tem impactado socioeconomicamente a vida de jovens e suas famílias. Os danos desse movimento podem ressoar de forma significativa na perda de futuros talentos e na qualidade da educação do país. Esse é o alerta do diretor do Sindicato dos Estabelecimentos de Educação Básica do Município do Rio de Janeiro (Sinepe Rio), Lucas Machado.
“A crescente popularização das apostas on-line e a migração de pessoas para esse universo estão contribuindo para a perda de talentos. O aumento do número de jovens que está se voltando para o mundo das apostas em sites e aplicativos on-line, ao invés de se dedicarem a cadernos, livros, estudos e desenvolvimento de suas habilidades, nos faz soar o alarme. Esse comportamento representa não apenas uma perda individual de potencial, mas também uma grave ameaça à competitividade e ao progresso do país, também no cenário internacional”, avalia o diretor.
“Cada jovem que abandona os estudos e a busca por qualificação para dedicar-se ao jogo representa uma perda para a sociedade. Perdemos futuros engenheiros, cientistas, professores, médicos, empresários, músicos, artistas, entre outros profissionais que poderiam estar contribuindo para o crescimento econômico, social e cultural do Brasil, em troca de uma falsa esperança de riqueza rápida”, acrescenta Lucas.
Danos para inovação e produtividade
Outro alerta destacado pelo diretor do Sinepe Rio são os prejuízos para inovação e produtividade, em longo prazo. O educador ressalta também que a falta de uma juventude qualificada afeta muito além da atmosfera educacional: “Os jovens brasileiros possuem um potencial inestimável para contribuir com diversas áreas do conhecimento e do mercado de trabalho. São eles que poderiam estar desenvolvendo inovações tecnológicas, liderando empreendimentos e promovendo avanços científicos e sociais. Essa fuga de talentos não só compromete o desenvolvimento individual, como também limita as possibilidades de inovação no cenário internacional”, analisa Lucas.
“Países que investem na qualificação de seus jovens colhem os frutos em termos de inovação, produtividade e competitividade globais. E em um mundo cada vez mais orientado por tecnologia e conhecimento, a ausência de uma juventude educada e preparada coloca o Brasil em uma posição de desvantagem perante outros mercados já solidificados. Cada vez que um estudante opta por abandonar a escola ou a universidade para buscar dinheiro rápido por meio de apostas, perdemos uma peça-chave nos quebra-cabeças do nosso futuro”, complementa.
União de forças
O diretor salienta que os gastos em apostas precisam estar além das fronteiras do ambiente escolar, sendo o resultado de uma união de forças sociais e políticas:
“Para que o Brasil mantenha sua competitividade global e promova o desenvolvimento sustentável, é crucial que o problema das apostas entre os jovens seja abordado de forma incisiva. Governos, escolas, famílias e a sociedade em geral devem unir forças para conscientizar os jovens sobre os perigos desse caminho e sobre a importância da educação como a verdadeira ferramenta para o sucesso”, diz.
Ilusionismo gamificado e endividamento familiar
No contexto econômico, levantamento do Banco Central, divulgado no fim de setembro, revela que os brasileiros gastam cerca de R$ 20 bilhões por mês em apostas on-line, somente nos primeiros oito meses de 2024. Por conta desse número, a instituição anunciou que monitora o impacto das apostas esportivas no nível de endividamento da população brasileira. Nas esferas juvenil e educacional, a percepção do educador é de que a ilusão pelo ganho financeiro rápido já está desequilibrando estruturas familiares.
“É notória a promessa ilusória de riqueza rápida que o universo das apostas oferece cria, vista em filmes e séries de canais de TV, funcionando como uma perigosa armadilha. Em vez de investir tempo e esforço em sua formação acadêmica e no desenvolvimento de habilidades profissionais, esses jovens acabam escolhendo um caminho de curto prazo, mas de consequências de longo alcance. Estão trocando o investimento sólido no próprio futuro pela incerteza de ganhos aleatórios, muitas vezes, arriscando a mesada ou mesmo o valor de uma refeição, sem perceber o alto custo dessa escolha. E, em alguns casos, até chegando ao ponto de subtrair valores de seus pais e familiares para alimentar o vício das apostas”.
Olhar humanizado para o vício e seus impactos socioemocionais
Lucas avalia que, apesar do cenário de epidemia de apostas na juventude, é importante analisá-lo também com um olhar humanizado, como parte de um quadro de vício e dentro do ambiente de saúde pública e futuros impactos socioemocionais.
“O vício em apostas funciona como uma doença, enraizando-se silenciosamente na vida dos indivíduos e destruindo não apenas suas finanças, mas também seu futuro. O sistema de recompensas das apostas, que alterna pequenas vitórias e grandes derrotas, cria uma dependência emocional difícil de ser rompida. Quanto mais um jovem se envolve nesse ciclo, mais se afasta da vida acadêmica e produtiva. Não se trata apenas de uma questão financeira, mas de perda de habilidades que poderiam ser desenvolvidas para enfrentar desafios reais do mercado de trabalho”, enfatiza.
“Se não agirmos agora, corremos o risco de perder uma geração inteira para o vício, com graves consequências não apenas para o futuro individual desses jovens, mas também para o progresso do país como um todo. A aposta mais segura que podemos fazer é na educação, conscientização e no desenvolvimento de nossos talentos, garantindo um futuro de sucesso e inovação para o povo brasileiro”, finaliza o diretor do Sinepe Rio.