As discussões em Plenário sobre a mudança na estrutura ministerial do governo Bolsonaro prevista na MP 870/19 seguiram as polêmicas da comissão mista que analisou a proposta: a competência para demarcar terras indígenas, as atribuições dos auditores da Receita Federal e o órgão a que está subordinado o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) foram os pontos mais controversos.
Até mesmo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, interveio durante a sessão da quarta-feira (22). Ele respondeu a uma fala do deputado Célio Silveira (PSDB-GO), segundo o qual o PSDB votaria “tudo o que for necessário para o País crescer e se desenvolver, inclusive a questão do Coaf, que se tornou nacional”. Maia avaliou que colocar o conselho no Ministério da Economia ou no da Justiça não é relevante para as contas nacionais. “O Coaf não vai fazer o Brasil crescer. Temos 20% da população cozinhando com lenha e carvão; é se preocupando com essas pessoas que vamos fazer o País crescer”, defendeu.
O Coaf fazia parte do Ministério da Fazenda até o fim do governo Temer. A MP transferiu o órgão para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, comandado por Sérgio Moro, mas a comissão especial decidiu devolvê-lo para o Ministério da Economia. O tema é objeto de destaque em Plenário. Houve até um requerimento do governo para que todos os temas fossem votados pelo sistema nominal, com o objetivo de garantir a divulgação dos deputados favoráveis ou contrários à mudança no Coaf. O pedido foi rechaçado pela maioria dos líderes, que chegaram a entrar em obstrução e arriscar o adiamento da votação da MP. O líder do PP, deputado Arthur Lira (AL), liderou a obstrução e pediu que o governo “tome juízo”.
A alteração do Coaf para Economia teve apoio da oposição. O líder do Psol, deputado Ivan Valente (SP), lembrou que foi sob a autoridade do Ministério da Fazenda, hoje Economia, que o Coaf identificou movimentações suspeitas que deram origem a investigações contra o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República. “Qualquer analista sério sabe que, nos países desenvolvidos (Alemanha, França, Espanha, entre outros), todo Coaf está no Ministério da Economia”, disse.
Para o deputado Diego Garcia (Pode-PR), porém, o Coaf será fortalecido sob a gerência de Sérgio Moro. “Essa mudança feita na comissão mista em nada vem agregar aos trabalhos que já vêm sendo muito bem desempenhados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. Muito pelo contrário”, criticou. O deputado Filipe Barros (PLS-PR) argumentou que devolver o Coaf à estrutura de Moro faz parte da lógica da estrutura organizacional proposta pelo Executivo. “Temos de compreender a proposta da nova estrutura ministerial do governo Bolsonaro: um Ministério da Justiça focado no combate à corrupção; um Ministério dos Direitos Humanos com a inclusão dos indígenas”, afirmou.
Funai
A Fundação Nacional do Índio (Funai) e a competência sobre a demarcação de terras indígenas foram incluídas no Ministério da Justiça pela comissão mista, em outro ponto controverso do texto. A oposição defendeu a mudança, que governo e parlamentares ligados ao agronegócio tentaram modificar. No texto original, a Funai foi transferida para a pasta dos Direitos Humanos e Família; e a demarcação, ao Ministério da Agricultura. Para o deputado Nilto Tatto (PT-SP), os índios não podem estar subordinados ao agronegócio. “Precisamos entender que a visão que os indígenas têm de território não é a mesma visão econômica que nós temos.” Filipe Barros, no entanto, sustentou que a ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, tem competência para gerir a questão indígena. “A ministra é mãe de uma indígena e foi militante nessa causa durante toda a sua vida”, apontou.
Receita
A limitação das competências dos auditores da Receita Federal, medida incluída pela comissão mista, foi outro ponto questionado durante os debates no Plenário. A interpretação é que o Fisco terá atuação prejudicada na identificação de crimes de colarinho branco. O deputado Bacelar (Pode-BA) criticou esse ponto do texto. “Essa diminuição da competência do auditor fiscal, limitando-se, em matéria criminal, à investigação dos crimes contra a ordem tributária ou relacionados ao controle aduaneiro, é um instrumento que vai dificultar o combate à corrupção”, comentou. O deputado Tadeu Alencar (PSB-PE) também condenou a mudança. “É uma coisa incrível que se queira subtrair da autoridade fiscalizatória a possibilidade de fazer representações fiscais com fins penais.”