A exploração de energia elétrica em alto-mar agora tem um marco regulatório. A Lei 15.097, de 2025, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e publicada no Diário Oficial da União da última sexta-feira (10), estabelece normas para a geração offshore no Brasil, incentivando o uso de fontes renováveis, como a eólica e a solar.
A nova lei teve origem no PL 576/2021, projeto de lei apresentado em 2021 pelo então senador Jean-Paul Prates (RN). O texto original do projeto regulava apenas a exploração de energia offshore, mas, durante a tramitação na Câmara dos Deputados, foram incluídas medidas que incentivavam a contratação de termelétricas a carvão mineral e gás natural. Essas mudanças acabaram sendo vetadas pelo presidente.
A lei define que o governo será responsável por delimitar as áreas marítimas destinadas à geração de energia elétrica. Essas regiões, chamadas de "prismas", poderão ser exploradas de duas formas: oferta permanente, quando empresas manifestam interesse por determinadas áreas, ou oferta planejada, quando o governo delimita previamente os locais e realiza leilões para concessão.
Os projetos de exploração, para serem aprovados, devem seguir normas ambientais e passar por estudos de impacto ambiental, análise de viabilidade técnica e econômica e avaliações sobre compatibilidade com outras atividades marítimas. Além disso, a lei incentiva o uso de novas tecnologias, como a produção de hidrogênio verde. Comunidades afetadas pelos empreendimentos deverão ser consultadas previamente, garantindo a participação social no processo.
Os empreendedores terão obrigações financeiras pelo uso das áreas marítimas, com a arrecadação dividida da seguinte forma: 50% para a União, 12,5% para os chamados estados confrontantes, 12,5% para os chamados municípios confrontantes, 10% para estados e o Distrito Federal, 10% para municípios e 5% para projetos sustentáveis em comunidades afetadas, como colônias de pescadores e ribeirinhos.
A lei também estabelece regras para o descomissionamento, garantindo que, ao final da vida útil dos projetos de exploração, os equipamentos sejam retirados e as áreas restauradas. Para evitar conflitos, a exploração será proibida em blocos já concedidos para exploração de petróleo e gás, rotas de navegação, áreas ambientais protegidas, territórios tombados como patrimônio cultural e regiões reservadas para exercícios militares.
Os empreendimentos precisarão ser integrados ao Sistema Interligado Nacional (SIN), que distribui a energia gerada no país. A conexão poderá ser feita pelo próprio investidor ou pelo governo, dependendo das condições técnicas e econômicas de cada projeto.
A regulamentação da lei ficará a cargo do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que deve definir diretrizes complementares, enquanto o Ministério de Minas e Energia e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) serão responsáveis pela fiscalização e implementação das normas.
Além disso, a lei permite que os contratos de outorga incluam a comercialização de créditos de carbono, incentivando a transição energética e a mitigação de emissões.
Vetos
Ao sancionar a lei, o presidente vetou dispositivos que obrigavam a contratação de termelétricas a carvão mineral e hidrogênio líquido até 2050. O governo argumentou que essas fontes encareceriam a energia elétrica para os consumidores e seriam incompatíveis com os compromissos ambientais assumidos pelo Brasil. O trecho vetado determinava que essas usinas deveriam operar com inflexibilidade mínima de 70% ao longo do ano, o que poderia gerar custos mais altos para os consumidores.
O governo também rejeitou trechos que prorrogavam subsídios para pequenas hidrelétricas, biomassa e energia eólica, argumentando que essa extensão poderia gerar custos adicionais para os consumidores, sem critérios claros de necessidade. Segundo a justificativa do veto, o Brasil já possui políticas de incentivo para fontes renováveis, e a prorrogação desses subsídios criaria distorções no mercado de energia.
Outro veto foi aplicado a mudanças nas regras da privatização da Eletrobras, que alteravam prazos contratuais e regras de repasses financeiros. O governo argumentou que essas alterações poderiam gerar insegurança jurídica nos contratos da empresa e comprometer a estabilidade do setor elétrico.
Além disso, foi vetada a ampliação do prazo para pequenos produtores começarem a injetar energia na rede. O governo alegou que essa flexibilização poderia desestimular investimentos na expansão do setor elétrico, já que adiaria prazos para o cumprimento de obrigações regulatórias.
Outro dispositivo vetado previa o uso de recursos da Eletrobras para cobrir dívidas antigas, como débitos da Conta-Covid. Criada em 2020, durante a pandemia, a Conta-Covid foi um mecanismo financeiro utilizado para socorrer distribuidoras de energia elétrica que enfrentavam dificuldades devido à redução do consumo e ao aumento da inadimplência no setor. O governo justificou o veto afirmando que essas contas já foram quitadas e que a destinação dos valores seria inadequada, podendo comprometer investimentos futuros da empresa no setor elétrico.
Os vetos serão analisados pelo Congresso Nacional, que poderá mantê-los ou derrubá-los em votação futura.
Áreas proibidas
O texto proíbe a exploração de energia elétrica em determinadas áreas. O objetivo é evitar ou diminuir potenciais conflitos. A proibição vale para:
- blocos licitados no regime de concessão, cessão onerosa ou de partilha de produção de petróleo;
- rotas de navegação marítima, fluvial, lacustre ou aérea;
- áreas protegidas pela legislação ambiental;
- áreas tombadas como paisagem cultural e natural nos sítios turísticos;
- áreas reservadas para a realização de exercícios pelas Forças Armadas; e
- áreas designadas com termo de autorização de uso sustentável no mar territorial.
No caso dos blocos para exploração de petróleo, podem ser constituídos prismas coincidentes, desde que haja compatibilidade entre as atividades. De igual forma, os setores outorgados para explorar energia elétrica offshore podem ser objeto de cessão para outras atividades, caso haja compatibilidade.
Contrato de cessão de uso
O contrato de cessão de uso deve prever duas fases: a de avaliação e a de execução. Na fase de avaliação, são realizados estudos para a determinação da viabilidade do empreendimento, como: análise técnica e econômica, impacto ambiental, externalidades, compatibilidade com as atividades locais, informações sobre o potencial energético da área, entre outros. Essas informações devem integrar o banco de dados do inventário brasileiro de energia offshore, de acesso público, admitida a definição de prazo de confidencialidade para sua divulgação.
Antes da conclusão do prazo definido no contrato de cessão de uso para a fase de avaliação, o outorgado deve apresentar declaração de viabilidade acompanhada de metas de implantação e operação do empreendimento, conforme o regulamento. A não apresentação da declaração no prazo de avaliação implica a extinção da outorga em relação ao respectivo prisma, e o outorgado não terá direito a reembolso ou ressarcimento de qualquer valor.
Na fase de execução, são realizadas as atividades de implantação e operação do empreendimento de aproveitamento de potencial energético offshore no respectivo prisma. De acordo com a proposta, a autorização ou a concessão outorgada não confere direito à exploração do serviço de geração de energia elétrica pelo cessionário, que dependerá de autorização outorgada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Participação governamental
Tanto o instrumento convocatório (edital de licitação ou de chamamento público) quanto o termo de outorga resultante devem prever a obrigatoriedade do pagamento das seguintes participações governamentais:
- bônus de assinatura correspondente ao pagamento ofertado na proposta para a obtenção da outorga;
- taxa de ocupação da área, calculada em real por quilômetro quadrado (R$/Km²), cujo pagamento será anual; e
- participação proporcional devida mensalmente, a partir da data de entrada em operação comercial, correspondente a percentual do valor da energia gerada pelo empreendimento, calculado conforme regulamento.
Distribuição
Em relação à distribuição das participações governamentais aos estados e municípios, a proposta prevê que, para o bônus de assinatura e a taxa de ocupação da área, o valor é destinado à União. Os valores recebidos pela União decorrentes da taxa de ocupação da área devem ser aplicados prioritariamente em ações destinadas à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação associadas à energia e à indústria.
Para a participação proporcional, o valor será distribuído assim:
- 50% para a União;
- 12,5% para os estados;
- 12,5% para os municípios confrontantes nos quais estão situadas a retroárea de conexão ao Sistema Interligado Nacional;
- 10% para os estados e o Distrito Federal, rateados na proporção do Fundo de Participação dos Estados (FPE); e
- 10% para os municípios, rateados na proporção do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
O texto também prevê que 5% da participação proporcional sejam destinados a projetos de desenvolvimento sustentável e econômico em comunidades impactadas nos municípios confrontantes, como colônias de pescadores e ribeirinhos.
Fonte: Agência Senado
Vinícius Gonçalves, sob supervisão de Patrícia Oliveira