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Traficantes do Rio cooptam militares e ex-militares para o crime

Agentes públicos ensinam táticas de guerrilha e manuseio de armas aos bandidos

Por Mario Hugo Monken em 12/07/2018 às 21:09:10

Armas apreendidas com sargento do Exército na Zona Oeste. (Divulgação Polícia Civil)

Militares e ex-militares continuam sendo cooptados pelo tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Eles podem trabalhar para os criminosos fornecendo material bélico ou consertando armamentos, como informantes e, até mesmo, ensinando táticas de guerrilha e manuseio de armas aos bandidos. Às vezes, até mesmo assumem o comando das quadrilhas. Em menos de um ano, ao menos cinco episódios se tornaram públicos.

O mais recente caso descoberto foi em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. O ex-soldado do Exército Hélio Rodrigues Fraga Júnior, conhecido como Juninho PQD, foi preso em fevereiro.

Ele era apontado como o chefe do tráfico na comunidade da Jaqueira e, segundo a polícia, treinava seus subordinados para o combate e atuava também no roubo de cargas.

Suposto fornecedor de armas

Em janeiro, foi preso o 2ª sargento do Exército, Renato Borges Maciel. Ele foi flagrado na Rodovia Presidente Dutra com 17 fuzis AR-15, dois AK-47, 41 pistolas de diversos calibres, 82 carregadores de pistola, 39 carregadores de fuzil, 54 tabletes de pasta base de cocaína e munição, material que supostamente abasteceria traficantes de favelas cariocas.

Segundo o Ministério Público Estadual, tudo indica que o militar exercia importante função na logística do transporte de armas, munições e drogas na organização criminosa, entre os Estados do Paraná e Rio de Janeiro, sendo certo que se valeu de sua condição de 2ª Sargento Intendente do Exército Brasileiro para, fardado, realizar o transporte de armas e drogas em veículo falsamente caracterizado, na tentativa de impedir a fiscalização nas rodovias brasileiras.

Militar soldado do tráfico baleado

No mesmo mês, o soldado da Aeronáutica Yan Klinio Fernandes, que era lotado no Grupamento de Apoio do Rio de Janeiro (GAP-RJ), foi baleado em uma troca de tiros com PMs no Morro da Primavera, em Cavalcanti, Zona Norte do Rio. Ele supostamente seria integrante do tráfico na localidade. Com ele e um comparsa que morreu no tiroteio, foram apreendidos um fuzil AK 47 calibre 7,62 com um carregador contendo sete cartuchos intactos, uma pistola Canik calibre 9mm com um carregador contendo seis cartuchos intactos, 210 pinos de cocaína e 115 trouxas/tabletes de maconha. O militar já havia sido preso em 2016 por sua suposta ligação com a bandidagem do vizinho Morro do Juramento.

Armeiro do TCP e da Rocinha

Mas o caso que tenha mais chamado atenção nos últimos meses foi o do sargento do Exército Carlos Alberto de Almeida, 46, preso em outubro. Segundo investigações, ele trabalhava há pelo menos dez anos como armeiro para os chefes do tráfico do Terceiro Comando Puro (TCP) nas comunidades Vila Aliança e Coréia, Zona Norte da capital, Vila dos Pinheiros, Parada de Lucas, Serrinha e Dendê, Zona Norte, e outras da Baixada Fluminense.

Na ocasião da sua prisão, foram apreendidos sete fuzis, seis pistolas, diversas peças de arma de fogo, acessórios de arma de fogo, carregadores e munições. Ele foi flagrado em um local onde funcionava uma oficina com maquinário de ponta, incluindo tornos mecânicos computadorizados, que eram utilizados para fabricar peças de armas e recondicionar armamentos. O militar lucrava cerca de R$ 3 mil por cada fuzil consertado. Teve participação na guerra do tráfico na Favela da Rocinha, Zona Sul, onde montou uma oficina dentro da comunidade para evitar retirar os fuzis do local.

X-9 do tráfico

Em 21 de agosto de 2017, um soldado de 19 anos do grupo de Artilharia e Campanha do Exército identificado como Matheus Ferreira Lopes Aguiar foi preso por suspeita de vazar para traficantes informações sobre operações das forças federais no Rio.

Segundo as investigações, Matheus teria alertado ao traficante foragido da Justiça, Marcos Antônio Jacinto da Silva, vulgo Biscolé, sobre quando e onde seriam as ações coordenadas pela Polícia Civil, com apoio das Forças Armadas e Polícia Militar. Biscolé integra a facção criminosa ´Comando Vermelho´, e atua no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo.

O recrutamento de ex-militares ou militares da ativa por traficantes vem sendo investigado pela polícia do Rio desde a década de 1990 e vários outros casos ao longo dos anos foram desvendados, até mesmo de integrantes das Forças Armadas que desviavam armas de quartéis para vender a criminosos.

As milícias também recrutariam militares. Em abril, durante uma festa do grupo paramilitar liderado por Wellington da Silva Braga, o Ecko, em Santa Cruz, Zona Oeste da capital, dois soldados do Exército e um da Aeronáutica foram detidos suspeitos de participarem da quadrilha.

Outro lado

A Seção de Comunicação Social do Comando Militar do Leste (CML) esclarece que o Exército é uma instituição de Estado baseada em sólidos princípios e valores, presente em todo o território nacional e pronta para atender às necessidades da Nação por meio de suas missões constitucionais: "defender a Pátria, garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, além de contribuir com o desenvolvimento nacional".

Em relação aos dados, em primeiro lugar é importante assinalar que a quantidade de militares descrita equivale a 0,0025 % do efetivo total do Exército.

Na nota, o CML informa ainda que é relevante também esclarecer que o Exército se empenha para que eventuais desvios de conduta sejam corrigidos dentro dos limites da lei, e repudia veementemente comportamentos ilegais ou incompatíveis com a ética e os bons costumes.

A assessoria de imprensa da Força Aérea Brasileira (FAB) informou que o militar citado responde ao processo judicial que tramita em uma Vara Criminal do Rio de Janeiro e que ele ainda pertence ao efetivo do Comando da Aeronáutica.

Procurado para falar sobre o problema, o Gabinete de Intervenção Federal informou que quem deveria responder sobre os questionamentos eram as próprias forças militares. As polícias Civil e Militar e a Secretaria de Segurança não se manifestaram.

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