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Justiça derruba 'Lei dos Loteamentos', um dia depois da prisão de Zé do Rolo

TJ RJ acolhe pedido do prefeito Crivella e do MP contra regularização a toque de caixa de empreendimentos imobiliários, até em áreas de preservação ambiental e sem lotes demarcados, comuns na Zona Oeste

Por Portal Eu, Rio! em 20/09/2019 às 15:48:24

Desabamento de prédios na Muzema, em abril passado, causou 24 mortes e deixou a nu riscos das construções e loteamentos irregulares Foto Centro de Operações Rio

A Prefeitura do Rio de Janeiro, por meio do prefeito Marcelo Crivella, e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da Subprocuradoria-Geral de Justiça de Assuntos Cíveis e Institucionais, por delegação do Procurador-Geral de Justiça, Eduardo Gussem, obtiveram na Justiça decisão que declara a inconstitucionalidade da Lei Complementar 188/2018, que dispõe sobre loteamento do solo.

A decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) acolheu os fundamentos expostos na petição inicial do MPRJ, no sentido de que a lei padecia de inconstitucionalidade formal. De acordo com a decisão, houve violação ao princípio da separação dos poderes. O acórdão observa que, ao dispor sobre o loteamento do solo de quase todo o Município do Rio de Janeiro, a lei interferiu no âmbito das atividades do Poder Executivo.

O acórdão destaca que o uso e o parcelamento do solo são atividades administrativas, representativa de atos de gestão, exclusivos do Poder Executivo, no exercício de seu poder discricionário. Segundo o entendimento dos desembargadores, a lei questionada promoveu o ordenamento territorial, usurpou a função do chefe do Executivo e feriu a Constituição do Estado.

A LC 188/2018 estendeu sua aplicação a 162 bairros, incluídas áreas de preservação ambiental e lotes sequer ocupados, o que seria um incentivo à especulação imobiliária de áreas dominadas por milícias, por exemplo. Como se não bastasse, foi editado sem qualquer estudo ou planejamento a lhe conferir um mínimo de legitimidade. A título de comparação para ilustrar a abrangência inaudita da LC188/2018, as leis complementares 160/2015 e 161/2015 abrangiam, ao todo, 13 bairros, onze vezes menos.

"A ocupação do solo urbano é um dos aspectos substanciais do planejamento urbano. Para tanto, torna-se necessária uma série de diretrizes individualizadas para fins de elaboração e aprovação de um Plano Diretor, que visa a ocupação ordenada do meio urbano", diz o acórdão acrescentando que a invasão de determinado órgão na competência privativa de outro órgão caracteriza vício formal de iniciativa.

A ação acolhida pelo Órgão Especial do TJ foi fundamentada em estudo do Grupo de Apoio Técnico Especializado (GATE/MPRJ) Ambiental, que demonstrou a ausência de qualquer estudo de impacto ambiental, concorrendo a lei impugnada para ocupação desordenada e predatória do espaço de quase totalidade das áreas do Município do Rio de Janeiro, estimulando a construção irregular e sem a prévia licença do órgão ambiental responsável.

A lei complementar 188/2018 favorece a expansão dos negócios imobiliários em áreas de milícias da Zona Oeste , principalmente em Vargens Grande e Pequena e Guaratiba. A lei, que permite a regularização de parcelamento do solo, onde existam edificações unifamiliares e bifamiliares, e, em seguida, a imediata legalização, flexibilizando o Código de Obras, chegou a ser vetada pelo prefeito Marcelo Crivella, mas a Câmara derrubou o veto.

Dias depois, a lei foi novamente contestada pelo corpo técnico da Secretaria Municipal de Urbanismo, Infraestrutura e Habitação, mas a Procuradoria Municipal nada fez. Na época, os técnicos alegaram que a nova legislação era inconstitucional por ferir a Lei Federal nº 13.465/2017, que dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana, estabelecendo exigências de contrapartidas para quem não é de baixa renda, que podem ser, por exemplo, a construção de creches, escolas e praças públicas.

Depois de examinar o conteúdo da norma, o MP-RJ concluiu agora que incorre "em flagrante inconstitucionalidade formal, na medida em que viola a iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo Municipal, já que trata de ordenamento e planejamento urbano, matérias que, segundo a Constituição Estadual, são de competência exclusiva do o prefeito", como sustenta o pedido.

De acordo com a petição inicial, há ainda na lei municipal inconstitucionalidades em razão da inexistência de participação popular na sua edição e ausência de prévio estudo de impactos urbanísticos e ambientais, com a violação aos princípios da função social da cidade e do direito ao meio ambiente ecologicamente saudável.

Decisão sai um dia depois da prisão de Zé do Rolo, apontado como responsável pelos prédios desabados da Muzema

A sentença do Órgão Especial do TJ RJ, contra a qual cabe recurso em tribunais superiores, foi publicada na quinta-feira (19/09), um dia depois da prisão de José Bezerra de Lira, o Zé do Rolo, acusado de ser o principal responsável pela construção dos prédios que desabaram na Muzema, no último dia 12 de abril. José Bezerra de Lira, conhecido como Zé do Rolo, de 42 anos, foi flagrado em um sítio de um dono de posto de gasolina em Afogados da Ingazeira, a cerca de 380 km do Recife.

A POlícia Militar de Pernambuco, Zé do Rolo tentou fugir pela caatinga da região quando os policiais chegaram ao sítio. Ele, que é natural de Brejinho, município vizinho de Afogados, foi encontrado com duas espingardas e munições e disse que fugiu do Rio temendo represálias da milícia da Muzema. Outros dois homens que estavam com ele também foram detidos. Contra Zé do Rolo havia um mandado de prisão preventiva expedido pelo Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) por homicídio qualificado das 24 pessoas que morreram na tragédia. Ele e mais outras duas pessoas são apontadas como responsáveis pela construção e venda dos imóveis que desabaram. Rafael Gomes da Costa e Renato Siqueira Ribeiro foram presos no Rio no dia 18 de maio e 5 de julho, respectivamente.


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