Tomo emprestada a expressão da genial Conceição Evaristo para ressaltar a necessidade de manter acesa a esperança de que é possível resistir e derrotar a ofensiva fascista no Brasil. Nesta peleja civilizatória, qualquer indivíduo, coletivo ou instituição que se incomoda ou se preocupa com o projeto totalitário de Jair Bolsonaro pode ser um aliado. Ainda que vagos, desejos de resistência e de vitória contra o obscurantismo já insinuam esperança na reconstrução da democracia.
O Brasil vive sob "tempestade perfeita" desde o golpe de 2016, o que se aprofundou com a eleição de Bolsonaro, cujo governo se estrutura em torno de quatro eixos: a) pulverização do Estado Democrático de Direito; b) ortodoxia neoliberal com entrega de nossas principais reservas de riqueza e potencialidades estratégicas ao capital internacional; c) desmonte do acervo de direitos sociais; d) fundamentalismo no plano da moral e dos costumes. Tudo temperado por sucessivos ataques do Planalto, com frequência vocalizados pelo próprio presidente, contra instituições republicanas: Congresso Nacional, STF, universidades federais, entre outros alvos. A imprensa também tem sido foco da "fúria bolsominion": veículos e jornalistas, especialmente mulheres, são sistematicamente atacados ou intimidados.
Como Lenin, indago: que fazer? A resposta pressupõe não confundir aliança para derrotar a ofensiva fascista e restaurar a democracia com aliança para se eleger e governar. No primeiro caso, reputo como válidas articulações com lideranças de centro ou até de direita, que se opõem ao desapreço pela democracia, ao ódio à ciência, ao fundamentalismo religioso e à infiltração da milícia no aparelho de Estado, traços do bolsonarismo. Ou seja, para enfrentar o fascismo não basta que apenas partidos e forças de esquerda se articulem. Contudo, aliança eleitoral, com a finalidade de governar, formular e implementar políticas, executar orçamento, discernir sobre prioridades, requer afinidade ideológica e programática.
Para os partidos, de modo geral, mas em especial para partidos de esquerda, a distinção entre aliança contra o fascismo e aliança eleitoral é indispensável. A história recente de partidos de esquerda que decidiram, por razões pragmáticas, relativizar sua identidade doutrinária, mostra que enfrentaram longo período de impopularidade: PS (França), PSOE (Espanha) e PC (Itália) fizeram derivas centristas e foram varridos do governo.
Assim, teimo em reconhecer que há elementos de esperança na resistência ao fascismo, sempre que alguém expressa preocupação ou incômodo com os atuais retrocessos no Brasil e manifesta, ainda que vagos, desejos de mudança. Porém, quando partidos de esquerda se associam a forças políticas que apoiaram o golpe de 2016, que festejaram a prisão de Lula, que dão guarida a milicianos em seus governos, temo pelo pior, pois fisiologismo, pragmatismo e eleitoralismo deformam a democracia e ainda contribuem para alimentar o pensamento totalitário de matriz fascista, quando deveríamos contê-lo a todo custo. Trata-se de tarefa urgente que impõe uma aliança humanista entre democratas, republicanos e constitucionalistas.