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Investigação de corrupção no Hospital de Bonsucesso será um dos focos da CPI da Covid

Núcleo do Senado vai apurar supostas irregularidades em hospitais federais no estado do Rio

Por Anderson Madeira em 21/07/2021 às 22:22:32

Foto: Divulgação

Com o anúncio feito pelo comando da CPI da Covid-19 no Senado, na semana passada, de que vai montar um núcleo que se dedicará exclusivamente a apurar supostas irregularidades em hospitais federais no estado do Rio de Janeiro, o Hospital Federal de Bonsucesso vai estar na mira. Isso foi definido após a CPI receberem documentos com denúncias apresentadas pelo ex-governador Wilson Witzel.

Em 2019, um aliado de um ex-diretor do Ministério da Saúde enviou ofícios sugerindo trocas nas gestões dos hospitais e até indicou Cristiane Rose Jourdan Gomes para comandar o Hospital Federal de Bonsucesso. Em 4 de novembro de 2019, Cristiane foi designada pelo governo federal para uma cadeira na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), conforme consta no Diário Oficial da União de tal data, em decreto assinado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro. O mandato dela vai até 31 de março de 2025.

Segundo denúncias de um ex-funcionário do Hospital Federal de Bonsucesso, que preferiu não se identificar por temer represálias, Cristiane fora indicada em agosto de 2019 para o cargo de diretora do HFB por Marcelo Muniz Lamberti, então diretor do Departamento de Gestão Hospitalar (DGH). O órgão é responsável por coordenar os hospitais federais do Ministério da Saúde no estado do Rio. “Lamberti forçou a nomeação de um diretor administrativo ao diretor do HFB de então, Paulo Roberto Cotrim. O cargo de diretor administrativo lida com compras e dinheiro público e é um cargo de indicação obviamente do diretor geral, que não aceitou e foi demitido. Cristiane nomeada aceitou a indicação”, contou o ex-servidor.

Cotrim tinha assumido em janeiro de 2019 como substituto da antiga diretora do hospital, a farmacêutica Luana Camargo, que fora antes indicada pelo deputado federal Wilson Bezerra (MDB) e que saiu após fazer uma festa no valor de R$ 156 mil em comemoração aos 71 anos do hospital, enquanto havia problemas no atendimento.

“Foi apresentada uma denúncia à corregedoria do Ministério da Saúde relatando problemas da gestão, como o fechamento do setor de oncologia, condenando à morte os 300 pacientes oncológicos do hospital; contratação da empresa Átrio/Gaia por Marcelo Lamberti e Cristiane, firma ligada ao empresário Mário Peixoto. Mesmo sem RH, insumos e EPI fecharam 28 clínicas, inclusive de transplante renal, do HFB, com o fechamento de mais de 200 leitos, sem EPI, respiradores e RH. O hospital ficou quase 40 dias fechado sem receber os 170 pacientes de Covid e outros. Sem EPI e sem um fluxo de trabalho para Covid, sete funcionários morreram desta doença. Foi o hospital público com maior número de funcionários mortos por Covid. Em plena pandemia, o diretor médico da unidade apoiava abertamente a reabertura de tudo, debochando da epidemia, sendo a direção de um hospital que, em tese, seria referência de Covid. Mas o Ministério da Saúde, em momento algum, indicou o HFB ou qualquer outro hospital federal como referência para Covid”, denunciou o ex-servidor, acrescentando que a contratação da Átrio fora sem licitação.

Lamberti tinha tentado indicar em 2019, como tesoureiro do hospital, Manoel Eduardo Maioli Rodrigues, ex-secretário de Saúde de Nova Friburgo e filiado ao PRB. Além dele, Guilherme Amorim Bittencourt, que é oficial do Corpo de Bombeiros, para o mesmo cargo. Na ocasião, Cotrim disse que rejeitou a indicação do ex-secretário de Friburgo por não ter passado pelo “crivo técnico junto à direção geral”. Na mesma época, os funcionários do hospital tinham divulgado uma carta de apoio a Cotrim, afirmando que ele rejeitava indicações políticas e estava gerenciando a unidade sozinho, apesar de todas as dificuldades.

Sobre as nomeações, o Ministério da Saúde informou que substituições em cargos de confiança refletem a busca pela eficiência e probidade. Afirmou ainda que movimentos para impedir a mudança devem ser entendidos como tentativa de defesa de interesses particulares ou corporativistas. O MS não se manifestou sobre as denúncias envolvendo o hospital. Também procurado, Lamberti não quis se manifestar.

Cristiane é médica e graduada em Direito. Durante alguns anos trabalhou como gestora de planos de saúde. Foi diretora do HFB até agosto de 2019. Nas suas redes sociais postou textos em defesa do uso da hidroxicloroquina para tratamento precoce da Covid-19 e da médica Nise Yamaguchi, conselheira do presidente Jair Bolsonaro. O remédio não tem nenhuma eficácia comprovada no combate à doença.

Segundo denúncias de ex-funcionários do HFB, houve um direcionamento para contratação da Átrio objetivando ser a responsável pela mão de obra terceirizada no hospital. Mário Peixoto fora preso em maio de 2020 pela Operação Lava Jato, por desvio de contratos na saúde do estado, inclusive durante a pandemia. Peixoto sempre é ligado a Witzel.

Em novembro de 2019, o HFB fez uma pesquisa de preços para contratar emergencialmente 290 funcionários para atuar em áreas administrativas e em serviços necessários ao atendimento dos pacientes: auxiliares de laboratório, técnicos em imobilizações ortopédicas e auxiliares de saúde bucal. Embora a Cemax tivesse apresentado o menor preço, em novembro, Lamberti e o então superintendente estadual do MS no Rio, Jonas Roza, afirmaram que houve vícios na contratação da empresa e escolheram a Átrio.

A reportagem entrou em contato com a superintendência do MS no Rio e a atual direção do HFB para falar sobre tais denúncias e, até o momento, não recebeu nenhuma resposta. O espaço está aberto.

A CPI da Covid anunciou que recrutará agentes da Polícia Federal e designará consultores para se debruçarem sobre os contratos e a gestão dos hospitais federais. A CPI ainda vai apurar conexões do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) com indicações de cargos para os hospitais federais no estado e com organizações sociais que atuam na área. A CPI quer saber se os diretores que teriam sido nomeados com aval do filho do presidente cometeram irregularidades.

A CPI vai analisar relatórios do Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e a quebra dos sigilos financeiros de organizações sociais que atuam em hospitais fluminenses.

As suspeitas da comissão sobre a gestão dos hospitais federais foram reforçadas quando, em maio, o coronel da reserva George Divério foi exonerado do cargo de superintendente do Ministério da Saúde no Rio após denúncia de que ele havia aprovado contratos suspeitos para reformar prédios administrativos durante a pandemia. Divério teria autorizado duas contratações sem licitação que somavam quase R$ 30 milhões, por uma empresa de pequeno porte.

Procurado pela imprensa, Flávio Bolsonaro afirmou que não há provas de irregularidades o envolvendo e negou ainda qualquer participação em esquema ilícito. Ele afirma que a CPI tem sido usada com fins políticos para desgastar o governo Bolsonaro, em vez de focar em desvios de recursos por governadores.

O Ministério Público Federal tinha entrado, em 2016, com ação na Justiça Federal do Rio de Janeiro questionando as contratações de funcionários nos hospitais federais, sem concurso público. Em novembro de 2020, o TRF-2 rejeitou a ação e o MPF recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O TRF-2 alegou que não cabe ao Poder Judiciário determinar a realização de concurso público. Em 17 de maio último, o ministro Humberto Martins rejeitou o recurso. O MPF impetrou novo recurso questionando a decisão.

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