O documentário "Nossos Mortos Têm Voz", sobre vítimas de violência do Estado na Baixada Fluminense, foi licenciado para a Universidade de Washington, nos Estados Unidos. Dirigido pelos cineastas Fernando Sousa e Gabriel Barbosa, da Quiprocó Filmes, eles também são responsáveis pela produção executiva do filme, que já foi exibido em outros países, além dos EUA. Exibições em Washington com participação virtual dos realizadores já estão confirmadas para o segundo semestre de 2021.
O documentário traz o depoimento de mães e familiares de vítimas de violência de Estado na Baixada Fluminense com as histórias atravessadas por essas perdas. A produção resgata a memória das vidas interrompidas com uma visão crítica sobre a atuação do Estado através das polícias na região, aborda a atuação dos grupos de extermínio a partir da década de 50 e das milícias mais recentemente, sobretudo, no que diz respeito à violência de agentes de Estado contra jovens negros.
O filme é licenciado em um contexto de desaparecimentos forçados, como o de três meninos em Belford Roxo, em dezembro do ano passado, e que até hoje não foram localizados. Aproximadamente 60% do total de pessoas desaparecidas no estado é dessa região na área metropolitana próxima à capital. Os dados são do Fórum Grita Baixada.
Em 31 de março de 2021, completaram-se 16 anos da chacina que até hoje vitimou mais pessoas na Baixada, quando 29 pessoas foram assassinadas em Nova Iguaçu e Queimados.
"É muito importante o licenciamento do documentário para a Universidade de Washington, nos Estados Unidos. A gente está muito feliz e acreditamos que o filme ganha ainda mais visibilidade no cenário internacional e sobretudo o debate sobre a violência do Estado no Brasil", afirma Fernando Sousa.
Para Adriano Araújo, mestre em Sociologia e coordenador do Fórum Grita Baixada, a exposição do filme reduz a invisibilidade das mortes de pobres e negros nas periferias.
"Para nós do Fórum Grita Baixada, esse licenciamento, que oferece condições legais para que professores e estudantes americanos, possam acessar o filme e possam usar o documentário nos debates e reflexões acadêmicas sobre a violência de estado na Baixada Fluminense é de grande importância. Expressa o desejo de conhecer melhor as dinâmicas da vinculação entre a participação de agentes públicos, letalidade policial, atuação de milícias e racismo. A exposição dessas dinâmicas enfraquece o caráter de invisibilidade das mortes de pobres e negros nas periferias, reacendendo a importância do debate sobre a necessidade de o Brasil se comprometer eficazmente no enfrentamento da violência de Estado e dos desaparecimentos forçados", opina.
Araújo ressalta outro ponto fundamental, consequência da comercialização do documentário no exterior.
"O interesse internacional, retratado no filme, é extremamente importante, na medida em que potencializa as possibilidades de diálogo, articulação, trocas de experiências e internacionalização da luta antirracista, contra a letalidade da polícia e da violência de estado com um olhar especial para as mães e os familiares das vítimas", celebra.
Assista no vídeo abaixo ao trailer do documentário "Nossos Mortos Têm Voz", produzido pela Quiprocó Filmes.
Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimentos Forçados
Em 2011, a ONU declarou o 30 de agosto como Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimentos Forçados, após a aprovação da Resolução 65/209 na reunião anual da Assembleia Geral das Nações Unidas, no ano anterior. O desaparecimento forçado de pessoas é definido pelas Nações Unidas como a privação de liberdade executada por agentes do Estado ou por pessoas e grupos agindo com sua cumplicidade, seguida da recusa em reconhecer que o fato aconteceu e da negação em informar o paradeiro ou destino da pessoa. Quando praticado de modo sistemático contra um segmento da população (movimentos políticos, membros de uma religião ou etnia), é considerado crime contra a humanidade e não pode ser anistiado. Os tratados internacionais proíbem os desaparecimentos forçados em qualquer circunstância, mesmo durante guerras.