Metade dos recém-nascidos que precisariam de uma cirurgia para correção de cardiopatia congênita ficam sem atendimento no Brasil, conforme dados da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp). A entidade estima, porém, que o percentual pode ter se elevado para 70% durante a pandemia da covid-19.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 130 milhões de crianças em todo o mundo têm alguma cardiopatia congênita.
De acordo com o Ministério da Saúde, no Brasil, são dez casos a cada mil nascidos vivos, ou uma criança a cada 100 nascimentos tem malformação cardiovascular. Segundo o site da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), é o equivalente a cerca de 30 mil crianças com cardiopatia congênita por ano, das quais 6% morrem antes de completar 1 ano. Após o nascimento, as formas graves da doença podem ser responsáveis por 30% dos óbitos no período neonatal. No último domingo (12), comemorou-se o Dia da Cardiopatia Congênita.
Em entrevista à Agência Brasil, a diretora médica da organização não governamental (ONG) Pro Criança Cardíaca, Isabela Rangel, explicou que as cardiopatias congênitas são más formações ou anomalias na estrutura ou não função cardiorrespiratória do coração. “Isso ocorre durante a vida fetal [da criança].”
Isabela disse que não há uma causa definida para as cardiopatias congênitas, que ocorrem pela interação de fatores genéticos e ambientais. “Genéticos, a gente fala quando são pacientes com outras síndromes, que podem vir associadas às malformações cardíacas. Ambientais, quando as mães usaram algum tipo de droga ou medicação, tiveram doenças como lúpus, diabetes ou algumas viroses que a gestante contraiu e podem acarretar malformação intracardíaca”. A médica lembra que é preciso estar atento também à história de cardiopatia em gestações anteriores e à herança genética.
As síndromes genéticas também são fatores associados à má formação intracardíaca, como é o caso da Síndrome de Down, em que um percentual de pacientes pode apresentar defeito do septo atrioventricular, entre outras cardiopatias. A idade materna avançada também é considerada fator de risco para cardiopatias congênitas.
Isabela Rangel ressaltou que não existe prevenção, mas disse que toda mulher que deseja engravidar precisa saber como estão suas condições de saúde, para que seu médico faça a acompanhe e oriente sobre drogas e medicamentos que não devem ser usados durante a gestação. A mulher tem que manter alimentação e hábitos saudáveis, evitando bebidas alcoólicas e fumo, que podem acarretar alteração no desenvolvimento do feto.
É importante checar também o calendário de vacinação e verificar se é preciso fazer alguma vacina antes de engravidar.
Isabela enfatizou a importância dos hábitos alimentares saudáveis, citando estudos recentes, segundo os quais o enriquecimento de alguns alimentos com ácido fólico foi associado a reduções na taxa de cardiopatias congênitas.
O diagnóstico da cardiopatia congênita é feito ainda com a criança ainda na barriga da mãe. Isabela disse que a ONG dirigida por ela vem tentando conscientizar todos os profissionais que lidam com gestantes sobre a importância de fazer o exame morfológico e o ecocardiograma fetal (ecofetal), capaz de detectar as cardiopatias congênitas.
O ecocardiograma fetal é um método capaz de identificar lesões estruturais antes do nascimento e, em geral, deve ser feito entre a 24ª e a 28ª semanas de gestação. “E se você tem uma cardiopatia que precise de intervenção logo nos primeiros dias de vida, isso é primordial para o prognóstico do bebê. Ainda mais quando se sabe que essa gestante tem um feto com cardiopatia e, sendo uma cardiopatia crítica, complexa, há todo um cuidado para que ela tenha o bebê em uma unidade de saúde que tenha UTI [unidade de terapia intensiva], em que a criança faça um eco após o nascimento, onde haja recursos, para o bebê ser tratado com toda atenção.”
Nem todos os bebês que têm cardiopatia congênita precisam ser operados ao nascer. Depende da patologia intracardíaca. As intervenções vão variar de acordo com a patologia e a gravidade. Isabela destacou que alguns bebês só vão ser operados bem mais tarde, enquanto outros, com cardiopatias mais graves, têm que passar pela intervenção logo no período neonatal.
O foco do projeto Pro Criança Cardíaca é cuidar de crianças e adolescentes carentes portadores de cardiopatia. O projeto recebe as crianças em nível ambulatorial e, dependendo de o caso ser cirúrgico, elas podem ser encaminhadas ao Hospital Pediátrico Pro Criança Jutta Batista, parceiro da ONG. O mesmo ocorre quando há diagnóstico para cateterismo terapêutico. “Qualquer procedimento invasivo é feito em nível hospitalar.”
O Pro Criança Cardíaca acompanha a criança desde bebê até a fase adulta, aos 18 anos de idade, e oferece uma equipe multidisciplinar de atendimento, que inclui medicamentos, cardiologistas, nutricionistas, assistentes sociais, psicólogos e dentistas, “porque os pacientes não podem ter nenhum foco infeccioso na boca”.
Fonte: Agência Brasil