A insuficiência da quantidade de lixeiras no bairro de Copacabana, na Zona Sul carioca, acabou gerando um protesto inusitado entre os moradores da localidade. O personal trainer, Bruno Rios, foi o idealizador da campanha e o primeiro a postar uma foto. Depois disso, os membros do Copacabana Alerta, um grupo do Facebook, estão publicando as selfies com o que denominaram de objetos raros. O objetivo das "Wastebasket Selfie ´s" é chamar a atenção dos responsáveis e tentar solucionar o problema.
Paulo Thomé, morador e presidente da AMADOFI (Associação de Moradores e Amigos das ruas Domingos Ferreira, Figueiredo Magalhães e Adjacências), é um dos que apoiadores da causa. Segundo ele, a falta das papeleiras se agravou em 2015 e foi alvo de debates acalorados entre a Associação de Moradores e de comerciantes juntamente com os representantes da COMLURB.
Paulo também conta que, em diversas reuniões do Conselho de Segurança de Copacabana e do Leme, os envolvidos sempre cobraram uma providência dos órgãos responsáveis, até que no ano de 2017 houve reposição. Contudo, foram observados alguns aspectos negativos quanto à recolocação dos objetos.
"Na época, muitas tinham defeitos graves de fabricação. Ao serem retiradas para o esvaziamento apresentavam problemas na recolocação. Muitas vezes, não fechavam mais e eram recolhidas sem reposição. Nunca mais, os números foram suficientes. Todavia, há sempre as duplas de fiscalização com o intuito de multar os mais desligados por sujarem as ruas. Eu, por exemplo, já presenciei pessoas que realmente cometem atos absurdos, mas sempre há as exceções. Vale lembrar que, após a implementação da lei que multa aqueles que sujam as vias públicas, a própria COMLURB foi a primeira a ser notificada", destacou o presidente da AMADOFI.
"Lixeira Go"
Para muitos moradores, as papeleiras viraram utensílios tão escassos que podem ser comparadas aos "Pokémons" caçados no famoso jogo on-line. A constatação rendeu até a criação de um meme sobre o assunto.
A empresária Geovanice Silva tem um estabelecimento em Copacabana e contou que vive há anos no bairro, mas nunca viu uma administração pública tão ruim como a atual.
"Em frente a minha loja tinha uma lixeira. Um dia, ela sumiu. Certa vez, há alguns meses atrás, eu vi um carro da prefeitura por perto e mais três funcionários arrumando outra lixeira na esquina da rua. Obviamente, aproveitei para questioná-los, pois percebi que dentro do veículo tinham cerca de 50 a 70 papeleiras. Pedi para colocarem uma no lugar daquela desaparecida e eles responderam que todas estavam sem as tampas e não podiam ser instaladas. Além disso, as únicas duas que poderiam ser utilizadas, já tinham locais pré-determinados", informou a empresária.
Geovanice ainda relatou que em outra ocasião estava fumando e tinha que jogar o seu cigarro apagado em algum lugar. Finalmente, quando encontrou uma "laranjinha", tinha muito lixo.
"Eu tentei achar um espaço para descartar o cigarro no meio da lixarada, mas deu um ventinho e meu cigarro caiu no chão. Rapidamente, fui abordada pelos fiscais da COMLURB que são pagos para tirar nosso dízimo. Pediram o meu documento e me neguei a dar. Afinal, a culpa não era minha. Eu sugeri que, se fosse o caso, eles chamassem a polícia. Porém, como sabiam que estavam errados não chamaram", contou.
Cadê as lixeiras de Copacabana?
Simone Freid também é moradora da princesinha do mar. Ela explica que inicialmente quem começou a sentir a falta das lixeiras foram aqueles que andavam com seus cachorros pelas ruas do bairro. Desse modo, quando precisavam descartar as fezes dos animais, não encontravam um local adequado.
"Aqui em casa temos dois cachorros. E, quando levávamos eles para passear, não encontrávamos as lixeiras para jogar o lixo com as fezes. A partir de então, comecei uma campanha tímida perguntando nos grupos do Facebook sobre as lixeiras. As pessoas começaram a reagir bem ao meu questionamento. Embora, sempre tem alguém que faça críticas não construtivas. Como tenho um enorme senso de cidadania, continuei na minha busca para tentar entender o que estava acontecendo", informou Simone.
Segundo ela, em uma conversa com Marcelo Maywald, um Superintendente da Zona Sul, ele confirmou que já tinha reclamado com a COMLURB e que a empresa estava com um processo de licitação para a compra de novas papeleiras.
"O Marcelo foi muito gentil e sempre se propôs a colaborar. Entretanto, no meio desta busca por explicações, eu e meu marido descobrimos que a COMLURB é uma empresa mista. Ou seja, que usa capital privado e estatal, mas que surpreendentemente fiscaliza e executa o próprio trabalho. Eu como alguém que acredita na privatização, acho que, inclusive, ela poderia ser totalmente privada e com a possibilidade de concorrentes no mercado. Mas não é possível que ela continue sendo a executora e fiscalizadora das suas funções, sem que não haja ninguém a mais responsável por isso", destacou.
Simone considera que os cidadãos precisam exigir seus direitos. Por tal motivo, ela é uma das pessoas que mais tem exigido da Companhia de limpeza. De acordo com a sua opinião, além de cumprir com as obrigações, a COMLURB precisa investir em uma política de conscientização da população.
Empresa Mista
A observação de Simone Freid sobre o modelo empresarial da COMLURB está correta. Ela é uma empresa mista. E o que isso significa? A entidade é uma sociedade anônima que tem a Prefeitura do Rio de Janeiro como sócia majoritária, além de outros sócios do setor privado.
A Companhia Municipal de Limpeza Urbana é a maior da América Latina e foi fundada por meio do Decreto-Lei N°102, publicado no ano de 1975. O ato autorizou a transformação da Companhia Estadual de Limpeza Urbana - CELURB no que ela é hoje.
Na prática, o controle do serviço prestado pela Companhia é realizado por ela mesma. Afinal, ela também detém o poder de polícia. Podendo não apenas fazer o policiamento sobre a sociedade civil em relação ao descarte de lixo, mas deixar passar em branco, as falhas da própria gestão. Isso porque não deve ter interesse em efetuar uma "autopunição".
O que diz a Comlurb?
De acordo com a Comlurb, entre 2012 e fevereiro de 2018, foram instaladas 64.616 papeleiras em toda a cidade do Rio de Janeiro. Desse total, cerca de 13.000 se perderam em função dos atos de vandalismo. Em algumas áreas, as perdas por roubos e furtos alcançam até 25%. Aproximadamente 17.000 lixeiras também foram retiradas das ruas por outros motivos, sendo 18% devido os furtos, entre 9% e 10% por mau estado e 72% sofreram desgaste natural. A Companhia afirma que trabalha com estimativas e percentuais.
Ainda segundo a Comlurb, durabilidade das chamdas papeleiras é de até 5 anos. Mas para isso é preciso eu haja a limpeza, a manutenção e o cuidado da população. A empresa reforça que elas são destinadas apenas para pequenos resíduos. Por isso, se receberem lixo domiciliar, caixas ou sofrerem uso de força para inclusão de objetos grandes, a durabilidade cai.
A empresa destaca que os catadores informais e a população em situação de rua também são responsáveis por boa parte dessa destruição, pois ao remexer no equipamento em busca de materiais potencialmente recicláveis para vender danificam os objetos. Atualmente, restam cerca de 30.000 papeleiras no município.. Desse modo, quando elas estão muito danificadas e sem chance de conserto, acabam sendo retiradas e entram na programação para reposição.
O material é transformado em sucata. A cuba é reaproveitada na Fábrica Aleixo Gari, em Campo Grande, e transformada em papão, uma pá em tamanho maior utilizada no trabalho de limpeza. A Comlurb ainda informa que os furtos acontecem em quase toda a cidade. Há registros generalizados em locais como Ipanema, na Zona Sul. No Méier, na Zona Norte e muitos casos na Avenida Brasil e no Centro da cidade.
A Companhia está em processo de licitação para a compra de mais 10.000 papeleiras para repor as perdas que estão sendo sentidas em regiões. Cada uma, custa em torno de R$ 70. No entanto, ela alerta que é preciso que os usuários respeitem mais o patrimônio público, não só por questão de educação, mas também porque a sua destruição gera gastos para os próprios usuários.
A média de instalações é de 10.000 unidades por ano, entre reposições, trocas e novos pontos. Para reduzir perdas futuras, a Companhia realizou novos estudos e os próximos equipamentos terão modelos um pouco diferentes, com mudanças nas especificações que os tornam mais resistentes e dificultam a abertura sem chave.
A Comlurb relembra que a disposição das lixeiras respeita um planejamento e os estudos realizados por técnicos. Por tal motivo, elas ficam concentradas em locais com maior fluxo de pedestres, pontos de ônibus, táxi, centros comerciais, ruas movimentadas etc. Nos bairros residenciais, a colocação segue outro padrão, de acordo com o planejamento operacional adequado para cada área.