A milícia que domina as favelas da Chacrinha e do Jordão, na Praça Seca, Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, tinha um faturamento semanal estimado entre R$ 15 mil e R$ 20 mil. Era cobrado toda semana taxas de segurança de R$ 40 a R$ 70 de moradores e comerciantes das comunidades e até R$ 50 de mototaxistas. Se não pagassem, eram expulsos. Pessoas que vivem em barracos não pagavam. A quadrilha explorava diversos serviços, tais como gatonet e venda de gás em botijões.
Esses altos rendimentos possibilitavam uma vida de luxo ao seu comandante, Horácio Souza Carvalho, que foi preso no ano passado em um apartamento de alto padrão, na Barra da Tijuca. BNa ocasião, foi encontrado com ele R$ 214 mil, um cordão de metal dourado e três anéis de ouro, joias avaliadas em cerca de R$ 50 mil, e um veículo Land Rover, modelo Evoque, que valia na época R$ 200 mil. Carros eram sempre blindados. O aluguel do apartamento custava-lhe R$ 5 mil mensais. Tudo isso, segundo ele próprio, fruto de sua atividade como miliciano. Ele ainda tinha planos de abrir uma agência de automóveis na Estrada Intendente Magalhães e vivia realizando festas.
Horácio acaba de ser condenado a uma pena de 22 anos de reclusão, em regime inicial fechado.
A prisão ocorreu muito próximo dele ingressar nas fileiras da Polícia Militar da qual havia prestado concurso e estava aguardando iniciar o curso de formação de soldados. Tanto que ciente que sua prisão iria atrapalhar sua entrada na corporação ofereceu dinheiro a policiais civis para não ir para a cadeia. "Tem desenrolo?", teria dito na época.
Os bastidores de uma guerra
A sentença de condenação de Horácio traz bastidores da violenta guerra entre milicianos e traficantes pelo controle de comunidades da Praça Seca e Jacarepaguá, que começou em 2017 e dura até os dias de hoje.
Horácio contou que entrou para a milícia aos 18 anos, saiu e voltou várias vezes e só assumiu a liderança porque o antigo dono, Hélio Albino Filho, o Lica, passou para o lado do Comando Vermelho (CV). Seu objetivo em entrar para o grupo paramilitar sempre foi "combater o tráfico".
A milícia de Horácio, conhecida como Bonde do H, no dia 7 de dezembro de 2017, invadiu a comunidade da ´Chacrinha com 30 homens, todos armados de pistolas e fuzis. Na oportunidade e nos dias que sucederam a invasão, o denunciado e os milicianos, mediante ameaça exercida com o emprego de armas de fogo, constrangeram diversas pessoas a abandonarem as suas residências, a fim de assumirem o comando da favela, exercendo o seu poderio no local, inclusive através da "venda" de serviços que originalmente são fornecidos por empresas prestadoras de serviços públicos.
Constam dos autos, ainda, que na mesma oportunidade, o bando armado matou um homem ainda não identificado, conhecido por Corujinha. A invasão à Chacrinha contou com o apoio de milicianos do Fubá e Campinho, na Zona Norte.
Horácio contou que seu grupo evitava entrar em confronto com os traficantes do Morro da Barão, na Praça Seca, porque a favela estava reforçada pela Cidade de Deus com 100 fuzis.
Também foi mencionado nos autos que Horácio conseguiu o apoio da milícia Liga da Justiça para fornecimento de armas por parte daquela facção com o objetivo que tivesse condições de manter seu império.
Nos autos, há menção também a uma suposta ligação de Horácio com o contraventor Rogério Andrade para a eliminação de desafetos dele.
Horácio prestou apoio ao miliciano Marquinho Catiri que teve sua comunidade em Bangu, também na Zona Oeste, invadida por rivais e o ajudou a recuperá-la.