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Ministério Público Militar arquiva investigação sobre oito mortes no Complexo do Salgueiro, em 2017

Segundo inquérito, não houve participação dos militares na ação

Por Mario Hugo Monken em 25/04/2019 às 15:12:31

Foto: Reprodução de internet

O Ministério Público Militar (MPM) divulgou nota esta semana informando ter concluído, após investigação minuciosa e complexa, tendo em vista os depoimentos dos militares que participaram de uma operação da Polícia Civil, que deixou oito mortos no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, no dia 11 de novembro de 2017, que não houve confronto por parte dos integrantes do Exército. A mesma conclusão se alinha com a narrativa dos policiais da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro de que nenhum dos participantes efetuou disparos.

Considerando, dessa forma, que todas as diligências disponíveis para se chegar à autoria dos disparos que produziram os óbitos e as lesões gravíssimas nas vítimas foram implementadas mas não forneceram elementos seguros que apontassem para a responsabilidade de militares do Exército, o Ministério Público Militar na primeira instância promoveu o arquivamento do Procedimento Investigatório Criminal.

A decisão de arquivamento, no entanto, foi submetida à apreciação da Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Militar, que, em 13 de março de 2019, de forma unânime, a homologou, em atenção ao disposto no § 1º do art. 19 da Resolução CSMPM 101/2018, ressalvando a reabertura da investigação caso surjam novas provas.

Segundo o comunicado,  o que restou apurado foi que o deslocamento dos militares do Exército ocorreu no segundo e no terceiro blindados, sendo este ocupado exclusivamente por integrantes da Força Terrestre. Também há consenso no sentido de que, seguindo à frente, o blindado da Polícia Civil do Rio de Janeiro interrompeu seu curso quando percebeu a existência de corpos supostamente alvejados à frente, diante do que, como os blindados com os militares estavam atrás, estes não poderiam ser os autores dos tiros que os abateram.

Perícia balística

A nota diz que as armas portadas pelos militares foram objeto de perícia balística, cuja conclusão corrobora a afirmação de que eles não efetuaram os disparos que deram causa aos oito óbitos. Além disso, os policiais da CORE afirmaram que nenhum dos ocupantes do blindado que abrigava militares e policiais civis disparou seu armamento.

De acordo com o MPM, diante da prova oral e pericial, que os autores dos disparos, seguramente provindos da mata e não dos blindados que eram utilizados na operação, eram pessoas externas ao contingente oficialmente empregado na operação, não sendo sequer absurdo dizer que integrantes de facção criminosa, seja a dominante no local, seja uma rival, tenham sido os autores.

Razões para investigação

A investigação foi instaurada pelo Ministério Público Militar porque militares do Exército participaram daquela operação prestando apoio ao titular da operação, a Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, por solicitação deste órgão. Não se tratou, segundo consta da investigação, de operação conjunta, mas de apoio logístico das Forças Armadas, que se concretizou com a cessão de dois blindados e de suas respectivas guarnições.

Durante a apuração, foram realizadas várias diligências, como a elaboração de laudos periciais relativos ao confronto balístico e ao armamento utilizado pelos militares, a solicitação de remessa das provas produzidas no inquérito policial instaurado pela autoridade policial do Estado do Rio de Janeiro, além da oitiva de todos os militares do Exército que participaram da operação no Complexo do Salgueiro. Civis foram igualmente ouvidos nos autos da apuração desenvolvida pelo Ministério Público Militar e todos os detalhes dos demais depoimentos prestados perante o MP estadual e Polícia Civil do Rio de Janeiro foram levados em consideração.

Provas frágeis

Todos os militares participantes da Operação relataram de forma uníssona que não efetuaram nenhum disparo, que não entraram em confronto e que já encontraram os corpos caídos quando a incursão na Estrada das Palmeiras se iniciou. Este relato coincide com o dos Policiais Civis que participaram da operação.

Cumpre ressaltar que a prova testemunhal carreada aos autos da investigação, apesar dos abrangentes questionamentos e das várias reinquirições, não é esclarecedora, a exemplo do que se afirmou a respeito da roupa usada pelos homens que teriam saído da mata, ora de cor preta, ora camuflada. Nesse contexto, é importante que se registre que traficantes no Estado do Rio de Janeiro, como é notório, possuem uniformes de todas as corporações e de serviços que sejam úteis ou necessários à prática de crimes.

Outro ponto importante a respeito da fragilidade da prova testemunhal é a alegação de uma testemunha civil no sentido de que no local dos fatos não haveria boca de fumo, quando é igualmente notório que se trata de área sob ação intensa de facção criminosa. Autoridades da Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro tem confirmado o elevado índice de criminalidade do local. Da mesma forma, o Comando Conjunto do Gabinete da Intervenção Federal informou, inclusive, que toda a região é utilizada como área de homizio por traficantes e como rota de fuga, pois é considerada como um local seguro para a prática de crimes. Na Estrada da Palmeira, a exemplo, são colocadas barricadas e contenções com o objetivo de retardar a aproximação das Forças de Segurança. Já a região da Serra de Itaúna é conhecida como a principal rota de fuga de traficantes da facção criminosa Comando Vermelho, possuindo cobertura vegetal e elevação que permitem posição de tiro favorável contra os agentes de segurança, além de servir como esconderijo de armas e drogas.

Coleta de dados prejudicada

A coleta de vestígios pela Polícia Civil restou prejudicada, porquanto a área dos fatos não foi isolada nem acautelada. O local não foi vistoriado de forma adequada, seja em razão das condições desfavoráveis de visibilidade e meteorológicas, seja em decorrência do elevado grau de periculosidade do ambiente.

De toda forma, o material extraído dos corpos e apresentado ao Ministério Público Militar foi confrontado com as armas utilizadas pelos militares, conforme perícia acostada aos autos do Procedimento Investigatório Criminal. De acordo com o respectivo laudo, o projétil e os fragmentos de projéteis retirados dos corpos das vítimas não foram disparados pelas armas usadas durante a operação. Este exame pericial foi levado a efeito pelo Centro de Criminalística da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, ou seja, por órgão externo à estrutura das Forças Armadas.

Denota-se, diante da prova oral e pericial, que os autores dos disparos, seguramente provindos da mata e não dos blindados que eram utilizados na operação, eram indivíduos externos ao contingente oficialmente empregado na operação, não sendo sequer absurdo

Por outro lado, a retomada da investigação da autoria dos homicídios, até então incerta, ou mesmo a eventual apuração de omissão na coleta de provas cabe à Polícia Civil e ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, em observância ao sistema constitucional de distribuição de competências, que reserva à Justiça dos Estados as infrações penais cujo conhecimento não caiba às Justiças Especializadas.

O Ministério Público Militar reitera sua solidariedade à dor das famílias das vítimas e mostra-se sensível à gravidade dos fatos apurados. Entretanto, é importante que se compreenda que o desfecho natural para esse caso não poderia ter sido outro que não o arquivamento, pois, após quatorze meses de investigação conduzida no âmbito do Parquet Castrense, de forma minuciosa e independente, não foi colhido nenhum indício seguro no sentido da participação de militares das Forças Armadas nos fatos delituosos.

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