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"Assassinos da Lua das Flores": a complexa missão de adaptar uma história essencial e levar para o grande público

Cinestesia, Por Gabi Fischer, Cineasta e Produtora

Em 17/01/2024 às 09:16:50

Uma história que todos precisam conhecer, pois o livro de David Grann faz o resgate histórico e, agora, o filme de Scorsese veio para potencializar. Os Osage são um povo originário dos Estados Unidos que foram expulsos de suas terras e enxotadas (no português bem claro) para Oklahoma, um local infértil e rochoso. No entanto, o ouro negro corria por todo esse território e esse povo se tornou milionário, ou melhor, com a maior renda per capita do mundo. É aquilo: acho que o jogo virou, não é mesmo? É assim que o filme já começa muito bem. Mas essa história não é feliz por completo.

Em seu livro, Grann traz o título “Assassinos da Lua das Flores”, que fala desse local, mas faz um paralelo com o que esse povo sofreu. Para melhor explicar: em abril, o território dos Osage, em Oklahoma, fica cheio de flores pequenas, que se espalham pra todos os lados, como se “os deuses haviam jogado confete”. Porém, em maio, flores maiores chegam, roubando luz e água das pequenas, quebrando os talos e fazendo as pétalas saírem flutuando. Por isso que dizem que maio é o mês da lua que mata as flores. Assim como o “homem branco”, que chegou nesse território e matou tantos desse povo. Para mim, foi graças à divulgação do filme de Scorsese que conheci essa história e fiquei curiosa, não só pelo peso histórico, mas também pelo subtítulo do livro: “Petróleo, morte e a origem do FBI” (guarde essa informação).

Vamos para o filme. Um projeto como esse, nas mãos de Martin Scorsese, já é a confirmação que seria um espetáculo, não só no sentido da palavra, por apresentar essa história a mais pessoas, mas também pelo primor que o cinema pode fazer. Toda a parte técnica, de direção, design de produção, trilha sonora e elenco é impecável. No entanto, é no roteiro que, para mim, o preciosismo de Scorsese diminuiu a história.

Por conhecer sua filmografia e todo seu estilo, sabemos que sua preferência por personagens masculinos, especialmente pra criticá-los, é uma marca (e eu aprovo!). E aqui, pela interrupção da produção pela pandemia, ele muda e traz os personagens Ernest (Leonardo DiCaprio) e William Hale (Robert De Niro) para destaques, sendo o “cafajeste” e o homem de maior frieza de suas ações. Isto foi a grande questão do filme, porque quando assistimos Mollie (Lily Gladstone), temos a certeza que ela é a emoção e merecia maior destaque. Inclusive, sua personagem é a personificação de todo o filme, pois o que acontece com ela é um paralelo do que ocorre com seu povo.

Sim, eu entendo a escolha (e carreira) do Scorsese, do holofote e condução narrativa estar nas mãos dos dois atores, mas a história me prenderia mais se Mollie tomasse as rédeas. Que fique claro: ela também é protagonista, tem bastante tempo de tela e não há como não babar com sua interpretação. Essa mulher diz tudo só no olhar, mas é a obsessão e paixão de Ernest que conduz. O diretor mesmo comenta sobre Ernest: “Ele era um homem fraco e perigoso, mas que a amava. Era uma relação perturbadora, mas não deixa de ser humana”. Usar esse personagem como condutor me lembra até de “Os Bons Companheiros”, pela dinâmica de um novato nos apresentar o universo.

Além disso, o filme tem sim muita informação e é impossível não ser tocado pela narrativa, porque você explode de raiva ao ver tudo que o povo passa, inclusive de muitos não poderem administrar suas fortunas (o governo os considerava “incapazes”). No entanto, apesar de todo respeito pelo o que está contando, senti que esses personagens foram bastante colocados como inocentes, que não sabiam tudo que estava acontecendo ou demorando para entender.

Ao optar pelo foco neste local, Scorsese, por exemplo, não coloca tanto o peso da investigação sobre o próprio petróleo. Curiosidade: nesta época é o início da criação da agência que se tornaria o FBI e o caso dos Osage foi a primeira grande investigação de policiais infiltrados em um local. Para isso acontecer, membros desse povo foram ao DC e pagaram 20.000 dólares para que fosse feito algo (atualmente seriam tipo 350.000 dólares).

Realmente, é um mar de informação (tem até mesmo o início da Ku Klux Klan) e escolhas precisam ser feitas para entrar na narrativa. Porém, faltou a chave cativante, a profundidade, o vínculo com esses personagens. Me encontrei em uma jornada de diversas informações (muito importantes), mas que foi também diminuindo o ritmo de mistério e tensão que tentou sustentar o filme até que tudo fosse resolvido.

Uma escolha que me agradou bastante é o resumo do julgamento sendo noticiado como que em uma gravação de rádio-novela. Além do ritmo ótimo, confirmamos, mais uma vez, o respeito de Scorsese por essa história, pois é ele mesmo que se coloca à frente das câmera para falar de Mollie. Na complexa missão de adaptar essa história, Scorsese tem paciência para apresentar as informações e desenvolver os acontecimentos. Claro que merece muitos aplausos e deve ser assistido!

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