Há uma ironia apetitosa em notar como andamos obcecados com o tempo. De alguma forma, fomos convencidos de que a vida precisa acontecer rápido e que o relógio não perdoa quem para. Planejamos, listamos, marcamos em agendas, aplicativos e até em post-it nas paredes – como se cada passo no caminho de um dia precisasse de placas e setas para garantir que estamos na direção correta. Parece que o ato de viver tornou-se subordinado ao de catalogar.
Mas, o que será que aconteceria se, por um segundo, parássemos de contar o tempo? Se apenas por um instante decidíssemos deixar de lado o relógio, a tela e o compromisso com a eficiência e rendimento? Quem pode nos garantir que a otimização do tempo é tão saudável assim? Talvez perceberíamos que a vida que tanto queremos controlar já está acontecendo, e que ela não precisa ser pautada para existir.
Vejo isso em pequenos detalhes do dia a dia, como no hábito banal de esperar que o café esfrie para então saboreá-lo – um ritual de paciência quase esquecido. Quantos de nós conseguem esperar hoje em dia? Esperar o café esfriar, a chuva passar... Se marcamos um jantar com um amigo que não vemos há tempos, ao invés aproveitarmos integralmente esse encontro, batemos ponto no aplicativo de mensagem com outras pessoas. Será que o online não pode mesmo esperar? Estamos sempre no próximo momento, no próximo passo, no próximo episódio e nessa pressa de seguir em frente, esquecemos do prazer de estar exatamente onde estamos.
Hoje, ao caminhar levianamente pela Avenida Paulista, como uma simples turista nesta eufórica cidade, fui imediatamente envolvida pela cena ao meu redor: pessoas correndo contra o tempo e integralmente imersas em seus tablets e celulares, conectadas a um mundo digital que parece nunca desacelerar. A agitação das ruas refletia a vida corrida que todos enfrentamos, onde cada um parece estar em uma missão digna de maratona, enquanto eu, por um – ímpar – momento, apenas preenchia o papel de observador.
Essa urgência não está só no tempo, mas na busca por resultado. Imploramos por liberdade e penalizamos a nossa própria prisão. Somos, sim, prisioneiros do tempo, do ciberespaço e da falsa sensação de produtividade. Medimos o valor das nossas experiências pelo que elas nos trazem, pelo que mostram ao mundo sobre nós, afinal, sem aprovação alheia somos incapazes de seguir, não é? Sentimos culpa se não há um propósito para cada minuto vivido, como se relaxar fosse um luxo que não cabe em dias de tantas tarefas – como se os dias de calma ainda existissem no mundo atual. Condenamos o descanso como um crime imperdoável. A troco de que?
Mas a vida é isso mesmo, não? Esse intervalo entre o que desejamos e o que, de fato, fazemos com as nossas horas por dia. É o espaço de incerteza entre uma etapa e outra, o ponto de repouso entre duas linhas de ação. E talvez seja justamente esse intervalo que mereça um pouco mais da nossa atenção. Afinal, ele é feito de pausas e silêncios, momentos sem proveito, olhares demorados para o magnífico nada – e isso também é vida.
Então, se o tempo permitir, que tal um minuto de atraso? Que tal uma manhã sem um "check" na agenda? Que tal um domingo, que seja, emudecendo o despertador e silenciando a mente? Que tal o prazer de um café morno e de uma página de livro lida sem pressa? Porque, no fim das contas, viver devagar é reconhecer que o agora já é o bastante, e que a maior liberdade que podemos ter é a de não precisar estar sempre em outro lugar, afinal, nenhum cárcere pode ser mais miserável do que aquele condenado por nós mesmos.
Do contrário, que então sirvam as algemas!
Até o próximo texto!
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