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"Os Ordinários": uma bússola que nos direciona como viver em plenitude

Olhar Teatral, Por Paty Lopes, Crítica Teatral

Em 12/03/2024 às 10:46:20

Posso dizer que temos uma reunião de potências, dos grandes fazedores do nosso teatro, no espetáculo “Os Ordinários”, que está no Sesc Copacabana. Aliás, gostaria de agradecer à Curadoria do Sesc por essa oportunidade. Muito, muito obrigada mesmo, por assistir a essa obra contemplada no Edital Sesc Pulsar.

Em um mundo tão louco, violento, a ponto de perdermos nossa sanidade mental diante dos fatos e atos da sociedade brasileira e mundial, me vi sonhando e rindo na Arena do SESC Copacabana. Como se eu estivesse em um universo paralelo, vi artistas que me levaram a uma espécie de Nárnia, a um mundo encantado, a um sonho, só que de olhos bem abertos, onde as nossas gargalhadas pareciam criar asas e voarem dentro do teatro. Mesmo com um roteiro inocente, muitas vezes eu não acreditava que ria com aquilo que assistia!

Não gosto de espetáculos com notas mais abrangentes de comicidade. Tenho pavor, confesso, de rir de algo que não acho graça. Chega a ser vexaminoso. No entanto, “Os Ordinários” furou uma bolha, me ensinou que posso rir ainda que o espetáculo não seja o estilo que eu curta. Porém, também me defenderei, pois falamos de um espetáculo que carrega o circo em sua essência. Amo o circo, onde a inocência parece fazer morada! Faz pouco tempo que assisti ao espetáculo infantil, no Sesc Tijuca, “Teco-Teco”, que, assim como o grupo LaMínima, me presenteou com uma montagem também MARAVILHOSA e risonha.

O Sesc defende o circo e isso nos faz reconhecer a importância dessa instituição que se faz presente a todos os estilos de arte que os artistas apresentam.

O circo, o riso, a poesia, a mímica, o amor, tudo junto ali, diante dos meus olhos. Que encanto, meu Deus!

Em noite de Oscar, eu ali assistindo artistas brasileiros ensinando que a guerra não é o caminho certo para nós humanos, assim como os grandes artistas do mundo com a mesma missão ao receberem suas estatuetas. Que gratidão eu tenho à vida por estar envolvida com essa classe!

De alguma forma, vi um pouco de Brecht no espetáculo, vi um pouco da Mãe Coragem, que resulta ao entendimento de que a guerra é inútil. Que lindo mergulho desse roteiro! Em uma de minhas aulas com o autor Newton Moreno, ele me ensinou que, quando se escreve para o teatro, sangramos, algo em nós está desconfortável. Como se confortar na guerra? Que excelência de texto, que magnitude em tão poucas palavras, quantos desdobramentos lindos que ele trouxe ao palco. Quanta poesia, quanto raciocínio lógico e leal ao que defendemos em relação à vida humana, essa que os artistas tanto defendem. Saí do teatro em estado de graça, rindo para tudo!

Da guerra à arte vista no palco, até agora procuro entender ou buscar palavras para falar sobre o que assisti. Ventríloquos humanos e de ossos no palco. Ah, o mambembe: que mistura mais bem-vinda para o espectador que ria sem parar! E os paraquedistas que pousam no palco? Um show de criatividade, tudo delicado demais…

A direção de Alvaro Saad merece todos os aplausos possíveis: é impecável, carregada de leveza, uma festa de boa direção. Ele está no mercado e carrega consigo um "fazer teatro" potente e altamente sedutor, seja para crianças ou adultos. Cada vez que o assisto, só tenho a agradecer por seu encantador teatro, suas pesquisas e conhecimentos postos a prova a cada montagem. Quem assistiu ao espetáculo “Circo de Pulgas” sabe do que falo, das mímicas que o artista abraçou em sua carreira artística. Só tenho mesmo a agradecer por esse caminho que ele teceu. GRANDIOSO Alvaro!

Eu queria escrever tanta coisa, tanta, mas, ao mesmo tempo, vou desnudar uma obra que merece ser vista e não contada. Peço desculpas ao leitor da Coluna "Olhar Teatral" do Portal Eu, Rio!, mas a arte do teatro é vivenciá-lo.

A iluminação do espetáculo é linda, obedecendo à dramaturgia, usando as palhetas de cores necessárias. Os movimentos de luz vinham com conhecimento, uma perícia salutar à obra. Bravo!

Fundado há 27 anos por Domingos Montagner e Fernando Sampaio, o grupo circense LaMínima traz em seu repertório atualmente 17 espetáculos. É fundador do Circo Zanni e vencedor de prêmios como Shell e Governador do Estado de São Paulo.

Vamos falar dos artistas no palco?

Abortarei palavras que, muitas vezes, nos colocam em lugares de críticos. Serei a espectadora, pois assim me considero: mais uma pessoa na plateia. Por mais que nos ocupemos desse lugar, afirmo que nossa sensibilidade não é diferente dos demais. Sentimos tanto quanto aos que estão na plateia. Que essa crítica venha ao encontro desses artistas que ensaiaram horas à procura de uma exatidão que convença o seu público. Não interessa, nesse momento, um texto que defenda o espetáculo, mas um acolhimento aos atores no palco. Essa é a minha finalidade.

O que dizer de três artistas que trazem "Bolero de Ravel" ao palco? E tocam outra música delicada com copos cheios de líquidos coloridos com medidas diferentes para haver diversos tons, um pequeno instrumento de corda e um xilofone infantil? O que falar de artistas que usam seus corpos, expressões faciais e vozes para nos apresentar uma obra que, por mais simples que seja, traz, em cada cena, sofisticação abundante? Não falo, mas reverencio. Simples assim.

Fernando Paz, Fernando Sampaio e Filipe Bregantim são os três "efes" mais convincentes que conheci. Juntos, ultrapassam o limite do que é ser bom. Gostaria de usar um efe para sintetizar minhas impressões, mas não ficaria de bom tom, como fala nossa atriz Ilana Kaplan. São palhaços, são musicais, são poetas, são bem mais do que eu merecia ter assistido!

A poesia de um dos personagens é divinal, bem-vinda sempre. Precisamos de poesia para continuar vivendo. Sem ela, fica mais difícil, mais complexo, desastroso mesmo. Vejo poesia no sol, no canto dos pássaros, nas músicas, nas crianças e, agora, no espetáculo “Os Ordinários”.

Eles brincam com eles mesmos, com suas estruturas físicas. É tudo tão bem bolado que os adultos se perdem, se encantam, se distraem e deixam com que o teatro cumpra sua função: entretenimento e reflexão.

Ao final do espetáculo tudo parece terminar de forma triste, pois pisam em uma mina de explosivo, mas há uma saída inteligentíssima e sensacional. Quer saber como eles saíram dessa enrascada? Vá assistir!

Resumo: temos uma obra digna, bela e que merece que todos a assistam para entenderem que a guerra não deve ser bem-vida, que o homem, muitas vezes, quer dar desculpa para que ela aconteça. Na verdade, não há absolutamente nada, nenhuma razão lógica para que ela destroce corpos, famílias, trabalhos de uma vida inteira e muito mais. São perdas para ambos os lados. A obra traz uma guerra que, mesmo diante do lúdico, apresenta motivos que nos convencem que o sentido está errado. A vida merece bem mais que isso, é para viver de uma forma mais oportuna. Afinal, não sabemos quando vamos pisar em uma mina. Por um instante de segundo a perdemos. Isso é cruel, eu sei, mas assim é a vida. Então que a vivamos com mais arte, mais sorrisos, mais teatro, mais banho de mar, mais tudo que sabemos ser bom!

“Os Ordinários” é uma bússola que nos direciona como viver em plenitude, porque estar feliz é estar pleno!

Sinopse

Misturando teatro, circo e humor, os atores Fernando Paz, Fernando Sampaio e Filipe Bregantim vivem três soldados em uma missão de guerra: um valentão, outro atrapalhado e outro que quer desistir antes de começar. Conforme avançam pelo território inimigo, entre tretas e tropeços, vai ficando evidente a inadequação do trio para o mundo da guerra. Mas, afinal, quem é adequado para a guerra?

Ficha Técnica

Concepção: Alvaro Assad, Fernando Paz, Fernando Sampaio e Filipe Bregantim

Roteiro: Newton Moreno, Alvaro Assad e LaMínima

Direção e Preparação Mímica: Alvaro Assad

Elenco: Fernando Paz, Fernando Sampaio, Filipe Bregantim

Assistente de Dramaturgia: Almir Martines

Direção Musical e Música Original: Marcelo Pellegrini

Iluminação: Marcel Alani
Figurino e Visagismo: Carol Badra
Cenografia: LaMínima
Adereços: Dario França, Juciê Batista e Reticências

Assessoria Técnica de Magia: Ricardo Malerbi
Operação de Som: Luana Alves
Operação de Luz: Marcel Alani
Direção de Produção: Luciana Lima
Produção Executiva: Priscila Cha
Produção e Administração: Chai Rodrigues
Assistência de Produção: Vanessa Zanola
Supervisão Geral: Fernando Sampaio

Realização: Sesc RJ e LaMínima

Serviço

Temporada: Até 24 de março

HORÁRIOS: 5ª a domingo, às 20h

Local: Arena do SESC Copacabana

INGRESSOS: na bilheteria

CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 anos

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