Um projeto de reestruturação da carreira para beneficiar as cúpulas da família militar, negligenciando as patentes mais baixas. Foi assim que representantes de associações destas categorias definiram o PL 1.645/2019 na audiência da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) que debateu a proposta na terça-feira (26/11). As associações pedem mudanças na reestruturação da carreira e tiveram o apoio dos senadores Major Olímpio (PSL-SP) e Izalci Lucas (PSDB-DF).
Izalci, que é vice-líder do governo, disse que fará gestões junto ao presidente Jair Bolsonaro e ao ministro da Economia, Paulo Guedes, para atender os pleitos das baixas patentes (sargentos, cabos e soldados, principalmente).
— Nas discussões sobre a reforma da Previdência (Emenda Constitucional 103, de 2019) e na PEC Paralela (PEC 133/2019), fizemos diversos acordos alterando o texto. Votamos destaques com impactos fiscais na casa das dezenas de bilhões de reais. Fui deputado junto com o presidente Bolsonaro e o discurso dele na época era bem diferente. Que haja um compromisso do governo de atender os pleitos justos, nem que seja por medida provisória. Este projeto de reestruturação tem pontos claramente injustos. Que ele seja aprovado como o governo quer, mas que haja um compromisso em enviar, depois, um novo projeto corrigindo as distorções — solicitou Izalci.
Para Cibele Lima, da Associação Brasileira dos Militares Especialistas da Aeronáutica (Abramear), o projeto de reestruturação tem uma filosofia "intrinsecamente elitista".
— Se queremos um pais melhor, a visão precisa ser macro, não micro. O Ministério da Defesa só leva em conta os interesses de 18% dos militares. Os graduados [praças, de baixa patente] são tratados como lixo. Senado, este é um grito de socorro, nos ajudem! Os generais vão ter 62% de aumento, enquanto a base, que é 82% da tropa, vai ter 4%. Se esse projeto passar, vão chover ações judiciais — reclamou Cibele Lima, apoiada por aplausos de militares graduados que lotaram a CRE.
Ivone Luzardo, da União Nacional de Esposas de Militares das Forças Armadas (Unemfa), sustenta que o projeto é marcado por "desigualdades extremas".
— 78% do adicional de habilitação, o equivalente a R$ 67 bilhões nos próximos 10 anos, será incorporado aos soldos dos oficiais-generais das três Forças. Não que eles não mereçam, nós é que não podemos admitir uma divisão tão desigual e desumana. Já 82% dos graduados, que é a tropa, ficarão com R$ 19 bilhões. Os generais terão ganhos de 59,49%, enquanto os terceiros-sargentos terão 4,1%. O reajuste bruto dos generais será de R$ 12 mil, e eles merecem. Mas os terceiros-sargentos terão R$ 229 — lamentou.
Adão Farias, da Federação Nacional dos Militares Graduados Inativos das Forças Armadas (Fengifa), pediu que o Senado e o governo abram mão de parte do superavit proporcionado pela proposta de reestruturação, e atendam pleitos de setores insatisfeitos. Ele apresentou sugestões de emendas ao senador Izalci Lucas.
— Os aumentos enormes se dão nos adicionais referentes aos cursos de Altos Estudos I e II, que eram privativos para oficiais-generais e superiores. Só agora abriram para os sargentos. Nossa proposta não tira nada de ninguém, só tenta melhorar a condição de quem se sente prejudicado nestes adicionais. Hoje um terceiro-sargento vai pra reserva com R$ 3.800, e vira motorista de Uber — disse Farias.
Fabrício Dias, da Associação dos Militares Inativos de Guaratinguetá e Adjacências (Amiga) e vereador do município paulista, também considera o PL 1.645/2019 "injusto".
— Os cursos de Altos Estudos não foram implementados aos militares graduados e aos militares que foram para a reserva desde 2001. Os graduados não fizeram esses cursos porque não era possível, não porque não quiseram fazer. E agora ficam sem essas gratificações. Com a reestruturação, os oficiais-generais pularão de R$ 21 mil pra R$ 33 mil por mês, enquanto um terceiro-sargento terá um aumento de pouco mais de R$ 200 — descreveu Dias.
O deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG) participou da audiência, e defendeu que "o governo precisa dar mais atenção aos pleitos dos graduados". Outro que reclamou foi Vanderlei Gonçalves, da União Nacional de Familiares das Forças Armadas e Auxiliares (Unifax), para quem os militares dos quadros especiais "não são atendidos em absolutamente nada nesta reestruturação".
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, falou em nome dos governadores, que pedem uma mudança no projeto, possibilitando aos estados definir livremente as alíquotas de contribuição de policiais militares e bombeiros aos respectivos sistemas de seguridade estaduais. A proposta do governo só abre essa possibilidade aos estados a partir de 2025, determinação que os governadores entendem ser ilegal. O projeto abarca os policiais e bombeiros militares dos estados.
A audiência pública foi comandada pelo presidente da CRE, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), e acompanhada pelo senador Arolde de Oliveira (PSD-RJ), relator do PL 1.645/2019 na comissão.
Fonte: Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)