"Africa Brasil: Um Dia Jorge Ben Voou Para Toda a Gente Ver" é o mais próximo de uma biografia de um dos maiores nomes da música

"Africa Brasil: Um Dia Jorge Ben Voou Para Toda a Gente Ver" é uma obra essencial para quem deseja compreender a trajetória única de Jorge Ben na música brasileira. Na verdade, é o mais próximo de uma biografia de Jorge Ben, esse artista do qual sou fã desde criança. Somente por isso, já valeria a pena a leitura. Contudo, o livro vai além.

Inicialmente, é muito bem escrito pela jornalista Kamille Viola. Adquiri na FLIP 2022, e, claro, com autógrafo. A autora mergulha nas várias camadas de um dos melhores álbuns do mundo, "África Brasil", lançado em 1976. Essa obra marca uma transição crucial na carreira do artista ao abandonar o violão acústico em favor da guitarra elétrica.

A narrativa percorre a discografia - e a vida - de Jorge Ben até chegar a esse LP. Temos ali diversas entrevistas com músicos, produtores, pesquisadores e até mesmo algumas personalidades inusitadas, como o craque de futebol Zico, homenageado na faixa "Camisa 10 da Gávea". Kamille Viola utiliza esses relatos para construir uma narrativa envolvente, revelando os bastidores da produção do álbum e oferecendo preciosidades sobre o processo criativo do artista e seu jeito de ser, sem usar drogas e sempre prezando pela lucidez.

Indubitavelmente, a troca do violão acústico pela guitarra elétrica é destacada como um momento marcante na carreira de Jorge Ben. O livro descreve bem como a mudança ocorreu e ressalta a importância da guitarra na evolução sonora do artista, conhecido como o criador do Samba-Rock.

Aliás, quem nunca pulou ao som de "Taj Mahal", não viveu. Eu mesmo, tantas e tantas vezes presenciei apresentações de Jorge Ben, gratuitamente nas praias cariocas, ou em casas de show. A força das canções desse homem, em especial, desse álbum, transcendem e atingem as pessoas de uma maneira única. É de uma brasilidade sagaz, tijucana. Jorge é nosso ponta de lança africana, Umbabarauma, goleador das composições emblemáticas.

A obra também destaca a influência de Jorge Ben em outros artistas, com depoimentos de figuras marcantes como Gilberto Gil, Marcelo D2, Lúcio Maia, Jorge Du Peixe, e outros. Em especial, a fala de Mano Brown, líder do grupo Racionais MC's, destaca a relevância de Jorge Ben de uma forma bastante íntima e pessoal. Aliás, como o retrato de toda uma juventude negra sem representatividade. Ele coloca Jorge Ben como uma espécie de figura paterna que nunca teve. Ele era a referência de homem negro bem sucedido na música e na arte para toda aquela geração (e várias depois). Afinal, a maioria das mães solo brasileiras são mulheres negras.

O livro fala ainda sobre o sucesso internacional de Jorge Ben e sua influência mundo afora. A autora ressalta o quanto tantos nomes da música nacional foram guiados e inspirados pela luz de Jorge Ben, influenciando movimentos musicais importantes no Brasil, como o tropicalismo, o rap nacional e o manguebeat. É muita coisa, não é mesmo?

A coleção "Discos da Música Brasileira," da qual o livro faz parte, é repleta de pérolas. Esse foi o primeiro que li. Em seguida, veio o "Acabou chorare: O rock'n'roll encontra a batida de João Gilberto". E o próximo é "Da lama ao caos: que som é esse que vem de Pernambuco?".

Kamille Viola enfrentou mais de uma década de pesquisa sobre a obra de Jorge Ben. Como resultado, ela eficazmente oferece um olhar perspicaz, jornalístico, mas ao mesmo tempo apaixonado, enriquecendo o cenário literário musical. Por outro lado, ela não deixa de salientar traços relevantes do músico de forma sutil. Ou seja, a partir disso tudo, "Africa Brasil: Um Dia Jorge Ben Voou Para Toda a Gente Ver" é uma leitura obrigatória para quem gosta de música, literatura e jornalismo, e para quem deseja explorar a genialidade de Jorge Ben e sua impactante contribuição para a Arte.