A ansiedade acelerava meu coração naquele 23 de novembro de 2019. Ora, não era para menos, pois eram 38 anos sem título quando, ainda uma criança de 8 anos, vi Zico & Cia. colocando os ingleses do Liverpool na roda, lá no Japão, no primeiro título da Libertadores, em 1981.
Aquela final contra o River Plate (ARG), em Lima, no Peru, partida válida pela Libertadores, era a oportunidade que o torcedor rubro-negro tinha para extravasar o grito de "campeão!" quase quatro décadas depois.
Gabriel B. (escrito dessa forma na camisa do jogo diante dos argentinos) era a esperança de gols no Estádio Monumental. Até ali, ninguém sabia o que o camisa 9 poderia fazer.
E nada fez. Pelo menos até os 88 minutos daquela final. Mas em três minutos, tudo mudou. Da perna esquerda saíram os gols do Flamengo que arrancaram da nossa garganta o engasgado título. Queiram ou não, Gabriel B. foi o responsável pelo bicampeonato do Mais Querido na Libertadores.
Repetiu o feito em 2022, no gol do tri. E ainda havia marcado o gol na final do ano anterior, em 2021. No entanto, o Palmeiras ficou com o título com um gol de Deyverson na prorrogação, depois de uma falha clamorosa de Andreas Pereira. Mas o camisa 9 anotou nada menos do que 11 gols e foi o artilheiro daquela edição.
A história que Gabriel B. escreveu em preto e vermelho chegará ao fim em 31 de dezembro de 2024, quando o contrato dele se encerra. O camisa 99 vai ser jogador do Cruzeiro na próxima temporada.
Gabriel B. já tem lugar cativo no mais alto panteão da lista de grandes ídolos da história do Flamengo, cortesia da espetacular participação no mágico ano de 2019. Na ocasião, além de ter sido artilheiro na conquista do título do Campeonato Brasileiro, ainda foi o grande herói da épica conquista da Libertadores da América na final única contra o River Plate.
Dito isto, Gabriel B. (o de 2019 que quero lembrar e mencionar aqui) é ídolo para muitos. Mas está longe de ser unanimidade.
Gabriel B. não pode ser comparado a Domingos da Guia e nem a Leônidas. Não deve ser colocado na mesma roda de conversa de, por exemplo, um Zizinho ou um Evaristo.
Sob hipótese alguma ser citado quando Dida, ídolo de Zico, for lembrado. O mesmo serve para nomes de outros monstros como Carlinhos, o Violino. Ou o Petkovi?, o gringo mais abrasileirado que vestiu o Manto Rubro-Negro.
Para estar ao lado de Zico, Andrade, Raul, Adílio, Tita, Mozer, Leonardo, Jorginho, Aldair, Adriano, Uri Geller, Rondinelli, Renato Gaúcho, Bebeto e tantos outros, faltou muita coisa. Profissionalismo foi uma delas.
Profissionalismo este que foi a ponta do iceberg afundando nas águas gélidas da relação com o clube (entenda diretoria). E os torcedores, sem poder fazer nada, naufragaram juntos.
Mas Gabriel B. fez gols importantes como Nunes. Decidiu como Zico. E representa em campo tudo que o torcedor adora. Pode não ter a representação de um Junior e de um Leandro para os mais velhos, como eu, por exemplo, mas para as crianças Gabriel B. é o Zico delas.
Simbiose mais do que normal entre fã e ídolo. Gabriel B. sai de cena com a camisa rubro-negra. Foi símbolo de uma geração surgida pós 7 a 1, na Copa do Mundo de 2014, em solo brasileiro.
Mas de coração: acredito que a torcida gostaria muito de tê-lo aqui por muito tempo. Os torcedores gostariam de vê-lo em campo defendendo as cores do Flamengo. Ou não ter que enfrentá-lo.
Mas no pacote de tudo que viveu no clube, lamento apenas que Gabriel B. não tenha tido oportunidades com Tite. Briga de egos. Perdeu o Flamengo. Perdeu a torcida. Perdeu o futebol.
Não serei louco em desmerecer o que Gabriel B. fez pelo time o qual sou torcedor.
O atacante foi o melhor do Flamengo no século. É ídolo em todos os tempos e responsável direto pelas mudanças - meu sobrinho Gabriel, antes tricolor, virou rubro-negro por causa dele.
Portanto, daqui a cinco jogos, Gabriel B. deixa de ser jogador do Flamengo. Mas o polêmico centroavante deixou tanto para o clube que nem as pisadas de bola tiram a trajetória campeã e inesquecível que teve na história do clube.