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“Zona de Interesse” precisa ser assistido por todos

Cinestesia, Por Gabi Fischer, Cineasta e Produtora

Em 05/03/2024 às 13:31:40

Muitas pessoas me questionam como que eu posso assistir ou gostar de filme de terror, como um “Invocação do Mal”, e dormir tranquilamente depois. Depois de assistir “Zona de Interesse” ganhei mais um título para dar de exemplo sobre o que realmente me dá medo: a própria humanidade.

Com indicações ao Oscar desse ano, incluindo na categoria de Melhor Filme, o longa-metragem de Johnatan Glazer é uma adaptação livre da obra de Martin Amis. Agora, em imagens, vamos conhecer uma família e sua casa, quase que como um retrato bucólico. No entanto, são nos detalhes que vamos percebendo, sejam os que vemos ou os que escutamos, sobre o terror que está bem à nossa frente.

Isto porque nesse “jardim paradisíaco” está a família de Rudolf Höss, um dos comandantes mais sádicos de Auschwitz. Sim, os nomes do filme são de pessoas reais e você pode pesquisar mais depois. Somente com essa informação, eu já queria confirmar o quanto que defendo que todos deveriam assistir esse filme e ser marcado por ele.

É um perfeito exemplo em forma de audiovisual do que Hannah Arendt explica sobre a banalidade do mal. O regime nazista foi essa normalização do horror em que tantos homens cumpriam ordens, sem criticar ou até questionar, pois dentro do totalitarismo não há espaço para a crítica. Assim, criou-se cenários como de “Zona de Interesse” em que uma casa vive perfeitamente, enquanto do outro lado do muro está um dos maiores campos de extermínio. Quem trabalha nesse “lar” teve sua vida roubada e, entre as paredes, são discutidos assuntos como de novas câmaras de gás.

A decupagem das cenas é muito detalhista. Perceba como que a profundidade de campo é essencial, como um homem de “pijama listrado” passa ao fundo entregando um cavalo ou as chaminés de fumaça aumentando no horizonte enquanto as crianças brincam na piscina. O design de produção dessa casa também chama a atenção, pois, apesar de grande, é sufocante, em que é preciso a todo momento desviar-se para que corpos não se encostem. Por falar no departamento de arte, fica o detalhe de um “novo” casaco de pele e, no bolso, um batom usado ou uma bota que é retirada para entrar em casa após o “dia de trabalho” pois está suja de sangue.

Posso listar os tantos detalhes do filme, mas deixe a sua experiência colocar você dentro desse cenário de terror. Então, é preciso falar que, para mim, a grande maestria do filme está no som. Mais uma vez, uma prova da banalidade do mal, já que o cantar de um pássaro é encarado da mesma forma que gritos e tiros. Além disso, a potência cresce, pois a imagem em si da violência sempre ficará no nosso imaginário enquanto, por exemplo, apenas assistimos ao perfil do comandante.

O diferencial e poder desse filme está em não ter um drama central ou narrativa, como um “O Menino do Pijama Listrado”, para criar um vínculo com o espectador. É um terror por acompanharmos algo tão aparentemente simples como a rotina de uma família, mas que veio romper e se destacar entre tudo que já foi produzido sobre o Holocausto. Daqueles que é preciso respirar bastante enquanto assistimos e até depois, já que ficaremos, por um bom tempo, falando sobre essa obra. Ainda bem!

Mais um filme produzido pela A24 que veio conquistar seu espaço na história do cinema. E você pode ver o trabalho de Sandra Hüller, bem diferente do que em “Anatomia de uma Queda”. A atriz merecidamente está no foco dos holofotes nessa temporada das premiações. Dez anos após “Sob a Pele” (o único filme que assisti dele), Jonathan Glazer veio deixar sua marca com esse drama histórico.

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