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"As Pessoas": narrativa em preciosidade performática

Olhar Teatral, Por Paty Lopes, Crítica Teatral

Em 12/03/2023 às 14:06:35

Crítica

Está chato sair de casa para assistir peças com os mesmos temas, tudo repetitivo demais, o mais do mesmo. Isso é falta de criatividade, sabemos disso. E quando um espetáculo vem com esses mesmos temas que permeiam na sociedade e nos palcos, já se desanima. Corajosamente, digo, pacientemente, que nos colocamos à disposição da escuta, do teatro. Surpreendentemente, uma dessas vezes somos sequestrados por uma obra. É o caso de "As Pessoas".

O que falar do texto, da atuação e da produção de Márcia Santos?

Atriz, produtora, autora, diretora teatral e cientista política formada pela UniRio, onde também se graduou em Artes Cênicas/Interpretação, ela é Mestra em Sociologia Política pelo IUPERJ/Cândido Mendes.

Profissional multidisciplinar, com atuação nas áreas cultural, política e acadêmica, seu monólogo “As Pessoas” foi contemplado com o Prêmio Sesc Artes Cênicas. Antes dele, com sucesso de público e de crítica, Márcia realizou duas dobradinhas como autora junto com Édio Nunes na direção: “Joãosinho e Laíla – Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia”, e “Luíza Mahin – Eu Ainda Continuo Aqui”, que estreou em 2021 e foi contemplado com os prêmios de Melhor Espetáculo e Melhor Atriz (Márcia Santos) no Festival Nacional de Teatro de Varginha (MG). Ora, isso é uma crítica ou um currículo da profissional Marcia Santos?, perguntaria o leitor. Essa é um pouco da estrada da profissional, que apresenta um monólogo eloquente, necessário e delicioso. Na ficha técnica tem o iluminador Paulo César Medeiros, o diretor Rogério Fanju, o figurinista Wanderley Gomes e o preparador corporal Édio Nunes. Todos já passaram por essa coluna, são potentes, bons no que fazem. Na verdade, estão além de bons, são verdadeiros profissionais das artes cênicas, nomes que dão ao espectador a chancela de algo, no mínimo, digno de aplausos.

No entanto, é impossível não dar a coroa da glória a Marcia Santos. Ela é imensa, em um palco com caixas, aonde ela conversa com essas mesmas caixas. Cada expressão facial da atriz é surpreendente: ela presenteia a todos nós com elas, que chegam sem piedade e nos carregam em seus sentimentos, nas sensações dessa personagem.

Se um palavrão está no texto, saibam, ainda que eu não tenha vocação à aprovação da vulgaridade, as palavras de baixo calão na boca da Márcia ficam muitíssimo bem, ela é foda!

Ela fala exatamente o que deve ser dito, toma uma golada imensa de floral e segue o texto, com dicas de Ho'oponopono, essa uma fuga ridícula que a sociedade quer nos impor em momentos que não cabem. Que me perdoem as interjeções: sinto muito, me perdoe, eu te amo ou obrigado, mas às vezes o que quero dizer é: vai à merda mesmo!

Incrível como o texto é real e não desalinha com o que deve ser dito.

São tantas questões que ela nos apresenta, seguidores de digitais influencers ocos - para não dizer idiotas -; grupos aterrorizantes de famíliam no whatsapp; o cuidado com o meio-ambiente; o racismo; feminicídio; os maus tratos aos animais; tudo isso chega no texto, mas sem ódio. E não para por aí: ela fala de política, diferença social, tudo isso sem gritaria ou heroísmo, apenas com fios de pensamentos inteligentes e tangíveis. Após as explicações dadas por ela, é uma verdadeira aula de cidadania, isso sim.

As expressões corporais dela também nos atravessam, mas levemente.

O teatro, na estreia, estava lotado. Uma das coisas que percebi foi que ninguém soltava gargalhadas forçadas, como tem acontecido comumente, um verdadeiro show de apelação. Marcia nos faz rir, nos faz entender o seu tamanho, sem forçação de barra. Marcia é uma atriz de ponta, uma atriz solar!

Sua cor de pele não a faz melhor ou pior que os demais artistas, mas meus amados leitores, sua coerência em ver a vida e o domínio dela na performance por ela executada, merecem palmas. Confesso, com louvores, que é exatamente isso que gostaria de ter feito.

Tocar em assuntos, sem ser leviana e repetitiva, é o sinal que Marcia Santos é realmente uma das maiores fazedoras de teatro do Brasil!

E, se a personagem queria se esconder, levou Marcia à evidência de mais artistas como ela...

Sinopse

“As Pessoas” é o desabafo de uma mulher instruída e cansada, que se sente inadequada, descrente e sozinha em sua forma de perceber o mundo, que ao movimentar caixas e livros, talvez na tentativa de construir uma muralha simbólica, tenta se separar e se proteger do mundo lá fora, já que o que ela deseja, é se esconder.

Ficha Técnica

Texto, atuação e produção: Márcia Santos

Direção: Rogério Fanju

Iluminação: Paulo César Medeiros

Cenografia: Daniel Leão

Trilha original e direção musical: Marcelo Alonso Neves

Figurino: Wanderley Gomes

Preparação vocal: Jorge Maia

Preparação corporal: Édio Nunes

Design gráfico e arte da janela cenográfica: Rômulo Medeiros

Assistência de Direção e Produção Executiva: Leandro Mello

Operador de Luz: Rafael Tutti

Operador de Som: Felipe Coquito

Serviço

“As Pessoas”

Temporada: Até 19 de março (de sexta a domingo)

Sessões: sexta e sábado, às 20h; domingo, às 19h

Local: Casa de Cultura Laura Alvim

Endereço: Av. Vieira Souto, 176 – Ipanema

Ingressos: 40,00 inteira/ 20,00 meia / 15,00 lista-amiga

Classificação: 14 anos

Duração: 65 minutos

Capacidade: 190 lugares


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