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"Canta Contos", espetáculo que atende adultos e crianças

Olhar Teatral, Por Paty Lopes, Crítica Teatral

Em 20/04/2023 às 21:06:46

"Canta Contos" é o nome do trabalho que assisti na sala Mario Tavares, no Theatro Municipal. Uma bela montagem, produzida por Julio Adrião, o eterno "Descobridor das Américas". Claro que não podia dar errado.

Quem conhece o artista sabe da sua devoção ao teatro. Júlio parece compreender os desejos de nós, espectadores, pois "Canta Contos" nos encanta e nos leva às fábulas um dia apresentadas no nosso passado, salpicados por contemporaneidade. Um excelente pulo do gato!

Ao chegar, vi Júlio. Ele estava recebendo o público, com seus cabelos esvoaçantes, andando de um lado para o outro, um produtor inquieto, pode-se dizer até mesmo que chato. Mas saibam: quando o produtor não é chato, minucioso e preocupado, coisa boa não chega, não atravessa. E falando-se deste artista, desta fera, óbvio que os pingos estariam no lugar.

A obra "Canta Contos" parece ser direcionada para o público infantil, mas posso afirmar que ela chega para todos. Eu mesma estava sentada ao lado da Sofia, filha de uma das integrantes da orquestra. A menina e eu tivemos as mesmas reações diante dos artistas a nossa frente, que se apresentavam no palco. Rimos e nos prostramos diante deles! Eu e Sofia, com um vestido de princesa, um par de orelhinhas de gato brilhantes e um All Star.

São três fábulas contadas na íntegra, sem enganação. Vamos falar de uma por uma, que foram acompanhadas por um orquestra afinada do simpático maestro Edvan Moraes.

A Sala Mario Tavares não tem um palco grande, mas atendeu aos artistas, embora eu preferiria um espaço maior, pela grandeza do que se vê nessa obra.

Todos sabemos que a sala Mario Tavares não tem muitos refletores, o que são necessários para a realização de algumas obras, mas mesmo assim os profissionais Guiga Ensá, na luz, e Leandro Lobo, no som, fizeram um excelente trabalho. Falarei sobre mais adiante.

"O Flautista de Hamelin", vamos começar por esse? Foi o primeiro conto a ser apresentado no palco.

A fábula é de 1849 e até hoje é bem-vinda no universo infantil, inclusive a menciono muito ao falar de alguns espetáculos, pois algumas vezes saio tão encantada do teatro que teria a certeza de que alguns artistas aprenderam com o tal flautista.

A história conta que uma cidade foi invadida por ratos e um flautista mágico os espanta através da melodia de seu instrumento, em troca de ouro. Ao concluir seu trabalho, a prefeita da cidade, um pouco parecida com os nossos governantes, um pouco só, para não escrever 100%, não cumpre a sua parte do negócio, não paga ao flautista. E assim ele também carrega as crianças. Está certo ele! Afinal, o homem trabalhou e tinha de ter o retorno do seu trabalho. Por aqui sumiriam as crianças, os bichos, as árvores, os artistas, e tantos outros…

Enfim, a história é cantada pela atriz Fernanda Botelho. Com uma voz lindíssima, ela faz a performance de todos os personagens, inclusive dos ratos. A atriz é uma graça, com um olhar brilhante, inquieto diante da plateia. Nota-se sua arte ao cantar e contar sua história, com um figurino artesanal, pois foi como eu os vi, nada deslumbrante, mas sim eficaz, pois nos remete aos livros, onde lemos as histórias. Claro que gosto de figurinos pomposos, mas o artesanal, posso dizer que tenho verdadeira admiração. No caso desse espetáculo, os figurinos nos levam ao lúdico, ao infantil, às nossas memórias afetivas guardadas lá na caixinha do coração.

Fernanda, quando representa os ratinhos indo embora da cidade de Hamelin, tira um tecido da sua saia, que tinha vários ratinhos pintados, parecia que à mão, com um estêncil auxiliando. Amei o trabalho dos figurinistas Pedro Gramegna e Rebecca Cardoso. A voz da atriz permitiu um canto doce e muito atrativo. Lindo mesmo!

Já a história do "Chapeuzinho Vermelho" ficou por conta do ator Francisco Sanchez.

Quem sobressaiu foi o Lobo Mau, não foi a menina de capa, pode isso? Pode, estamos em 2023, parece que podemos tudo! Vestido de princesa com tênis! E quer saber? Fica lindo!

A Chapeuzinho virou coadjuvante pela primeira vez na minha vida, inclusive foi nesse dia que conheci a história original, aonde ela era comida pelo lobo. Oh! Quanta maldade desses artistas, depois de tanto tempo iludida pela história paralela, eles a desnudarem assim, em uma tarde chuvosa de sábado...

Fico pensando: se até hoje eu vivi com essa mentira, por que mudar agora?

Enfim, Francisco foi fantástico, porque trouxe um Lobo Mau divertido, engraçado, que lambia os dedos e ainda narrava sua história, falava sobre suas vestes sujas de sangue da avó da Chapeuzinho Vermelho. Sei lá, mas acho que as crianças de hoje são mais hard que eu no meu passado, posso dizer que muito, muito, muito distante mesmo do que um dia fui!

Sua indumentária nos fez rir, pois na capa do chapeuzinho, que ele também interpretou, ao virar de costas, tinha a cabeça do lobo, e era peluda. Rimos! A capa não era vermelha!

E o artista ainda tocava corneta, trazendo sonoplastia para seu papel. Ah! Um deslumbre, embora um pouco hardcore, mas a arte imita a vida, né?

E outra, o lobo era simpático, como criar aversão ao bicho?

E saibam que enquanto tudo isso acontecia, a orquestra tocava para acompanhar as vozes!

No último ato, entra Suzana Nascimento. A moça é do teatro! Posso dizer que já vi a atriz, soberana, à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira, contando a história de "Pedro e o Lobo". Ela foi fantástica, linda, dócil e não tão dissimulada como no "Canta Contos".

Suzana interpreta a Bela, da "Bela e a Fera". Essa personagem vem completamente diferente de tudo que já vi. Sabemos que Suzana não é uma cantora de musicais. Espertamente, trouxe tudo que tinha na mala do teatro para alcançar seu público.

Cantava e falava com sua plateia. Também como os demais artistas, ela aproximou-se mais do "não canto".

Ao narrar sua história, nos contemplou com deboches e muitas mazelas dos seus personagens, inclusive da própria Bela, que perde sua compostura diante da beleza da Fera. "Gato" é o que ela fala ao contemplar a beleza do príncipe antes de ser a besta.

Suzana brincou com a plateia, trouxe sua realidade, seus pães de queijo na farta mesa do castelo do príncipe transformado em Fera. Ela abusou da criatividade, entrava e saia da personagem sem arranhões. Nós rachávamos de rir em nossas poltronas!

Seu figurino apresentava uma trança de tecido que ela, como uma jovem de 2023, usava para jogar seu charme!

Em sua saia havia uma camada de pelos. Era a Fera que ela interpretava! Quando ela o encenava, usaram uma contraluz lilás, com recursos que davam movimento à iluminação. Essa trazia ao personagem mais força e o som usou de recursos que potencializam a voz da Fera. Incrível as mãos desses fazedores de teatro. Uma perspicácia ímpar!

As irmãs da Bela eram trazidas ao palco com expressões faciais horrorosas. Suzana não poupou nada, veio para brilhar, reinar.

A obra foi apresentada pela primeira vez, um embrião que merece crescer, seguir, ir para os palcos, para que toda família assista junto.

Fui convidada pela atriz Suzana Nascimento. Nos últimos minutos do segundo tempo, eu estava com outra peça na agenda, mas dei um jeitinho. Ela disse que eu iria gostar e acertou! Errou somente no verbo: eu não gostei, eu amei!

Cabe a mim pontuar, nessa crítica, quanto essa montagem, quanto foi o aporte dado para sua execução.

Embora eu conflite com as diretrizes do Governo do Estado, posso dizer que, na questão cultural, a escolha da secretária de cultura Daniele Barros foi muito assertiva.

Danielle trouxe inúmeros editais, acolheu aos bate-bolas, entre muitos outros representantes da cultura brasileira que permeiam em terras fluminenses. Foram os povos originários, os quilombolas, os representantes da Folia de Reis, ela dá um exemplo do que é uma cultura para todos, o que é equidade.

Em sua gestão, os artistas portadores de deficiência física foram contemplados em um edital formatado somente para eles, que - inclusive - contou com a supervisão de uma universidade federal.

Quanto ao Theatro Municipal, a presidente Clara Paulino não anda em direção contrária. No edital "Municipal em Cena", ela levou o povo para o espaço que é do povo. O Theatro Municipal pertence a todos os cariocas. Não me lembro de ter visto tantas obras populares dentro dele como nesses últimos tempos. Obviamente que muitos projetos não agradaram tanto, mas fato que a oportunidade veio para todos, igualmente, e isso já é o suficiente.

"Cantos Contos" foi uma das melhores escolhas desse edital.

Na meu mundo utópico, eu gostaria de ser curadora dos equipamentos públicos e ter também direito às intercessões em emissoras abertas. Certo que essa obra estaria em circulação! Gostaria de ter também acesso a ônibus gratuitos para trazer das comunidades crianças e famílias inteiras para assistir essa graça de espetáculo. Tenho certeza que, em dez anos, mudaria um pouco a história da minha cidade, essa que tanto amo!

Vida longa a "Cantos Contos" e seus artistas. Fiquem de olho, eles voltarão!


Sinopse

"Canta Contos" é um espetáculo cênico-cantante-sinfônico-literário, um concerto de “cantação” de histórias. A apresentação de conhecidos contos de fadas de forma inusitada, cantados e poetizados, com uma música que valoriza a compreensão de seus textos, divertida de ouvir e executada com uma variada gama de instrumentos. O espetáculo é a versão brasileira do projeto Gabriela Mistral Canta Cuentos, criado pelo ator e compositor chileno Francisco Sánchez, do Tryo Teatro Banda, que musicou e orquestrou os contos Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho e Cinderela a partir de versões reescritas em verso pela poetisa Gabriela Mistral (Nobel de Literatura). Cada história foi interpretada por um ator/cantor, acompanhado por músicos da Orquestra Sinfônica Nacional Juvenil do Chile, em um concerto registrado em vídeo e transmitido na inauguração de uma rede de fibra ótica que liga 100 centros culturais no país.


Ficha Técnica:

Coordenação Geral – Julio Adrião Produções Artísticas

Coordenação de Produção – Fernanda Botelho

Produção Executiva (Chile) – Carolina González

Produção Executiva (Brasil) – Fernando Alax

Direção, adaptações poéticas, composição e orquestração – Francisco Sánchez

Atuação – Fernanda Botelho, Francisco Sanchez e Suzana Nascimento

Versões em português – Vitor Louzada

Direção Musical e Regência – Edvan Moraes

Camerata de Esquina e músicos convidados:

- Dalibor Svab - violino

- Helena Camargo - violino

- Isabelle Ferreira - violino

- João Victor (JayV) - clarineta e flauta transversa

- Jocelynne Cardenas - viola

- Juliana Bravim - oboé

- Luiza Chaim - violino

- Marcos Vieira - viola

- Matheus Tabosa - contrabaixo

- Nayara Tamarozi - violoncelo

- Raphael Dias - percussão

Preparação Vocal – Chiara Santoro e Anna Priscilla Lacerda

Figurinos – Pedro Gramegna e Rebecca Cardoso

Iluminação e operação de luz – Guiga Ensá

Sound Design e operação de som – Leandro Lobo

Sonorização – Quintal da Ideia

Coordenação de montagem de palco – Rubem Calazans

Tradução em LIBRAS – Juliete Viana

Fotografia – Daniel Barboza

Captação e edição de vídeos – Vida Longa Audiovisual

Identidade Visual / Design Gráfico – Fernando Alax


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