A dificuldade no acesso a informações do Google e do Facebook é o maior obstáculo nas investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista do mandato, Anderson Gomes, crime que completa dois anos neste sábado. O desabafo sobre as barreiras enfrentadas na hora de conseguir informações junto ao mais popular mecanismo de busca do planeta e da maior rede social parte da coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPRJ), promotora de Justiça Simone Sibilio. A promotora, que chegou a ser ameaçada de morte em mensagens anônimas investigadas pela Polícia Civil, afirmou que os avanços obtidos até aqui são significativos, em especial diante da complexidade das execuções, cometidas por dois "profissionais do crime", com ampla formação militar e vasto conhecimento sobre como agir sem deixar rastros – Ronnie Lessa é policial militar reformado, enquanto Élcio Queiroz, ex-PM.
"Posso garantir o absoluto empenho da nossa equipe, que resultará na elucidação do caso, com o esclarecimento se houve ou não a figura do mandante. Nesse aspecto, de identificação dos possíveis autores, o maior empecilho é o acesso a informações do Google e do Facebook. Elas são vitais. Nós já as solicitamos e, hoje, nossos pedidos são alvos de mandados de segurança, em análise no Superior Tribunal de Justiça", pontuou Simone Sibilio.
Em nota oficial anterior à do encontro, na qual faz um balanço das investigações, o Ministério Público informa o andamento da discussão no STJ envolvendo os pedidos de acesso a informações do buscador e da rede social:
"Estão em curso quatro ações em tramitação nos Tribunais Superiores, ajuizadas pelas empresas Google e Facebook, visando a reformar decisão da Justiça estadual que deferiu a quebra de dados telemáticos solicitados pelo GAECO/MPRJ que, em muito, poderá auxiliar a elucidação de fatos. São mandados de segurança impetrados que impedem o fornecimento de informações legítimas e relevantes ao prosseguimento das investigações nesta segunda fase de apuração. O julgamento das ações será pautado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em paralelo, também deve ser lembrado que, no local do crime, foram encontrados nove cartuchos, oito deles pertencentes a um lote UZZ18, vendido com exclusividade à Polícia Federal e utilizado no crime. A investigação foi instaurada em 2018, de competência da Justiça federal e até o momento não foi concluída, destaca o texto.
As declarações de Simone Sibilio foram divulgadas em nota oficial na qual o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) informou a visita, na manhã de sexta-feira (13/03), de parentes da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, assassinados no dia 14 de março de 2018. Participaram do encontro o procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem, e membros do parquet fluminense diretamente envolvidos nas investigações, além de integrantes da Anistia Internacional no Brasil. A reunião dá sequência à rotina de diversas conversas já realizadas entre os promotores que cuidam do caso, que completará dois anos neste sábado (14/3), e familiares das vítimas.
A diretora executiva da Anistia Internacional no Brasil, Jurema Werneck, ressaltou a grande mobilização da sociedade civil em busca da elucidação dos crimes, com a procura por novas informações sobre os rumos da investigação – em especial sobre a sua autoria, com a identificação dos possíveis mandantes. Jurema questionou sobre os avanços concretos no tempo já transcorrido e sobre as dificuldades, e possíveis entraves, enfrentados neste processo.
Em resposta, a coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPRJ), promotora de Justiça Simone Sibilio, enumerou os desdobramentos efetivos já obtidos no caso, como a prisão dos executores Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, que irão a júri popular, e da esposa de Ronnie, além da identificação do chamado "Escritório do Crime" e a deflagração de operações como Intocáveis I e Intocáveis II, que resultaram na prisão de milicianos, também envolvidos com Ronnie Lessa.
Na resposta à diretora da Anistia Intenacional é que Simone Sibilio destacou a importância dos mandados de segurança no STJ para a liberação das informações por Google e Facebook, por sua vez essenciais para ajudar a elucidar os contatos dos supostos executores e as pesquisas que realizaram às vésperas do crime, que podem resultar na pista dos possíveis mandantes.
Quanto à sugestão de que as conversas entre membros do MPRJ e familiares de Marielle e Anderson sejam realizadas de forma ainda mais rotineira, feita pela representante da Anistia Internacional, Eduardo Gussem destacou que o MPRJ está sempre de portas abertas à interação com organizações da sociedade civil atuantes e responsáveis. "Nós não temos lado, bandeira ou partido. Atuamos na busca incansável da legalidade e da verdade absoluta. Nos pautamos pela atuação técnica. Estamos conscientes do cumprimento de nosso papel, das nossas atribuições e da importância estratégica do sigilo no curso das investigações", afirmou o PGJ.
Participaram do encontro os pais de Marielle, Antônio Francisco da Silva Neto e Marinete da Silva. Mais uma vez, ambos renovaram a confiança na atuação do MPRJ. "Confio em absoluto no trabalho desenvolvido pelo Ministério Público. Acredito que, ao final, chegaremos à punição efetiva dos responsáveis pelos crimes. Compreendemos a complexidade para desvendar os possíveis autores", disse ela, reforçando ser contra as tentativas de se federalizar as investigações do caso. O pai da vereadora complementou: "se não fosse a dedicação das promotoras do Rio, possivelmente sequer os executores estariam presos".
A mesma linha foi adotada pela representante da Anistia Internacional no Brasil, ao final do encontro. "Agradeço pela oportunidade de diálogo, fundamental neste caso, e pelos esclarecimentos prestados pela equipe de promotoras de Justiça. Já temos recolhidas quase dois milhões de assinaturas de cidadãos cobrando as respostas sobre este caso. E, pelo que nos foi apresentado nesta reunião, seguimos confiantes na sua elucidação", afirmou Jurema.
Também presente na reunião, a viúva de Anderson Gomes, Ágatha Arnaus Reis ressaltou o acolhimento recebido pelo Ministério Público fluminense desde o cometimento do crime. "Ao longo de todo esse processo, o MPRJ foi o único órgão que demonstrou irrestrita atuação em relação às investigações sobre a morte de Anderson Gomes, na mesma medida que merece toda indignação, por parte do conjunto da sociedade, a morte de Marielle Franco, enquanto parlamentar reconhecida enquanto defensora dos Direitos Humanos".
Participaram ainda do encontro as promotoras de Justiça Letícia Emile Alqueres Petriz, assistente do GAECO/MPRJ; Eliane de Lima Pereira e Roberta Rosa Ribeiro, respectivamente assessora e assistente de Direitos Humanos e de Minorias (ADHM/MPRJ). Pela Anistia Internacional no Brasil, participaram a coordenadora de Comunicação e Campanhas, Juliana Fernandes Câmara, e o assessor Thiago Câmara. A conversa contou também com a presença de Marcelle Decothé, ativista do recém-inaugurado Instituto Marielle Franco.
Com site do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro