A portaria do Ministério da Educação (MEC) que revogou a recomendação de uma política de cotas para negros, indígenas e pessoas com deficiência nos cursos de pós-graduação nas universidades federais gerou reação no Senado. A revogação foi publicada nesta quinta-feira (18), pelo então ministro Abraham Weintraub, que teve a saída da pasta anunciada à tarde. A portaria já é alvo de três projetos que buscam a sua sustação e podem ser votados na próxima semana.
O texto revogado por Weintraub é outra portaria, de 2016, que exigia das universidades federais a promoção de políticas de cotas em programas de pós-graduação. A norma determinava que as instituições federais de ensino superior apresentassem propostas de inclusão em seus programas de mestrado e doutorado e criassem comissões para discutir e aperfeiçoar ações nesse sentido.
Os projetos para sustar a portaria foram apresentados pelo líder da Rede, senador Randolfe Rodrigues (AP), pela líder do Cidadania, senadora Eliziane Gama (MA), com a bancada do partido, e pelo líder do PT, senador Rogério Carvalho (PT-SE), com a bancada do partido e a senadora Zenaide Maia (Pros-RN). O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, informou que os projetos apresentados nesta quinta-feira já haviam sido recebidos pela Secretaria Geral da Mesa e prometeu incluir os textos na pauta da próxima semana.
As reações à medida derradeira de Weintraub não se limitaram ao Legislativo. O Ministério Público Federal (MPF), pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC/RJ), instaurou inquérito para apurar a legalidade da edição da Portaria do MEC n. 45, de 16 de junho de 2020. A portaria revoga a Portaria Normativa n. 13/2016, que dispõe sobre a indução de ações afirmativas na pós-graduação para inclusão de negros, indígenas e pessoas com deficiência em seus programas de pós-graduação.
A Portaria 13/2016 estabelece que, respeitada a autonomia universitária, as Instituições Federais de Ensino Superior devem criar comissões próprias e apresentar propostas para a inclusão desses grupos em programas de pós graduação, incumbindo à Capes coordenar a elaboração de censo universitário. A nova portaria, assinada pelo Ministro da Educação, não apresenta os motivos do ato. Em nota, posterior ao anúncio do Ministério Público Federal, o MEC argumentou que a portaria atendia a um decreto do presidente Jair Bolsonaro estabelecendo a anulação imediata de portarias e quaisquer normas infraconstitucionais ultrapassadas por normas posteriores ou que não tivessem clara justificativa.
Última medida de Weintraub é inconstitucional e ofende direitos de minorias, para senadores da oposição
Durante a sessão deliberativa remota desta quinta-feira, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do PDL 284/2020 classificou a atitude do ministro de “infame”. Para ele, a portaria é inconstitucional e ofende direitos de minorias.
—No apagar das luzes da gestão do Ministro Weintraub, ele editou essa medida infame, que ofende os a particularidade dos direitos dos povos indígenas, ofende uma conquista histórica da luta do movimento negro brasileiro e ofende a evolução civilizatória de conquistas como essa das políticas de cotas. Nós não podemos permitir que isso avance — disse o senador, que pediu a inclusão dos projetos na pauta.
Ao apresentar o PDL 287/2020, o senador Rogério Carvalho disse considerar que o Ministério da Educação revelou mais uma vez "total descompromisso com políticas de redução das desigualdades educacionais e de promoção da igualdade racial", além de desrespeito à luta histórica de negros, indígenas e pessoas com deficiência por igualdade e justiça social.
“O ato do Ministro de Estado da Educação pode ser considerado mais uma expressão da institucionalização do racismo em nosso país, ainda severamente marcado pelo extermínio da população jovem, pobre, negra e periférica, bem como pelo genocídio dos povos indígenas”, disse Carvalho ao apresentar o projeto. O senador afirmou que a ação de Weintraub parece ter sido motivada por vingança. Em Plenário, também pediu a inclusão do projeto na pauta.
Autora do PDL 289/2020, a senadora Eliziane Gama lembrou que as políticas afirmativas já são constitucionalmente asseguradas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). No projeto, ela argumenta que, embora representem a maior parte da população (52,9%), os estudantes negros são apenas 28,9% do total de pós-graduandos. Para a senadora, a revogação é um retrocesso na luta por equidade no Brasil.
— Nós vamos trazer um resultado muito ruim para o Brasil. As cotas são uma ação de reparo do poder público com os negros, com os deficientes, com os índios, que infelizmente não têm acesso às universidades como deveriam ter — lamentou a senadora, que também pediu a votação dos projetos para sustar a portaria.
Na sessão deliberativa, a senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) manifestou apoio ao pedido feito pelos colegas para que os projetos fossem votados com a maior brevidade possível.
Pelas redes sociais, Fabiano Contarato (Rede-ES) também criticou a decisão do MEC e disse que pode recorrer ao Judiciário contra a medida. “Em plena efervescência das reivindicações do movimento negro e ações em favor dos indígenas, recebemos mais este ataque insidioso do bolsonarismo às suas conquistas. Iremos ao Judiciário anular esse desmando, pois a Constituição não admite retrocessos”, informou.
Paulo Rocha (PT-PA) classificou a portaria do ministro como uma atitude indigna. “Nós lutamos pela educação e devemos impedir essa atitude indigna do ministro da Educação. Queremos também maior inclusão de negros, indígenas e pessoas com deficiência nos cursos de mestrado e doutorado”, publicou.
Flávio Arns (Rede-PR) prometeu trabalhar pela revogação da portaria. “A medida está na contramão de tudo o que sempre defendemos para a educação, pois anula ações de inclusão de pessoas com deficiência, indígenas e negros na pós-graduação”, disse o senador pelo Twitter.
Ao criticar a portaria pelas redes sociais, o senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB) afirmou que os senadores estão se mobilizando pela derrubada do texto. “Nós já estamos nos mobilizando no Congresso para revogar este ato arbitrário e descabido. Não bastassem todas as maldades que o ex-ministro fez em sua gestão, no apagar das luzes não se conteve e ainda encontrou espaço para mais esta”, criticou.
Agência Senado