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Passa boi, passa boiada

Investigado em dose dupla no Supremo, Ricardo Salles deixa o Meio Ambiente

Pasta passa a Joaquim Álvaro Pereira Leite, secretário de Amazônia e Serviços Ambientais, foco das críticas de governos e fundos estrangeiros


Ricardo Salles, que ocupava o Meio Ambiente desde o início do mandato de Bolsonaro, em 2019, é investigado em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal. Foto: Agência Brasil

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu demissão do cargo nesta quarta-feira (23). A exoneração, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro, foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União. No lugar de Salles, o presidente nomeou Joaquim Álvaro Pereira Leite, que até então ocupava o cargo de secretário da Amazônia e Serviços Ambientais do ministério. Pereira Leite foi por muitos anos diretor da Sociedade Rural Brasileira, até o surgimento da União Democrática Ruralista a principal defensora dos interesses dos grandes proprietários agrícolas do País.

Esta semana, o celular pessoal de Salles foi enviado aos Estados Unidos para perícia especializada, por determinação do ministro do STF Alexandre de Moraes. Representantes de vinte dos maiores fundos internacionais de investimento, em reunião com representantes do Itamaraty e da Economia, deixaram explícita a insatisfação com o desmatamento e as queimadas, particularmente na Amazônia.

Ricardo Salles, que ocupava o cargo desde o início do mandato de Bolsonaro, em 2019, é investigado em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF). No mês passado, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, Salles foi alvo de mandados de busca e apreensão e teve seus sigilos bancário e fiscal quebrados, no âmbito da Operação Akuanduba, deflagrada pela Polícia Federal (PF). O órgão apura crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando, praticados por agentes públicos e empresários. A operação resultou na maior apreensão de madeira ilegalmente extraída da História brasileira, com 40 mil toras.

Ouça no podcast do Eu, Rio! (eurio.com.br) a reportagem da Rádio Nacional sobre a mudança no Ministério do Meio Ambiente, com a saída de Ricardo Salles, alvo de dois inquéritos no Supremo e com sigilos bancário e fiscal quebrados.

A investigação é sobre um esquema internacional de exportação ilegal de madeira. Além do agora ex-ministro, outras 17 pessoas são investigadas. Na época, o STF também determinou o afastamento de Eduardo Bim do cargo de presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Responsável pela abertura do procedimento investigatório, o delegado Alexandre Saraiva terminou exonerado da superintendência da Polícia Federal no Amazonas. Ontem, Saraiva publicou um tweet em seu perfil ironizando a queda do ministro, responsável pelas pressões de bastidores para a substituição na Superintendência da PF.


Após a publicação de sua exoneração, Ricardo Salles fez um pronunciamento à imprensa, no Palácio do Planalto, para explicar os motivos de sua saída. Segundo ele, está ocorrendo no país um processo de "criminalização" de opiniões divergentes sobre a questão ambiental e, por isso, ele estava abrindo espaço para maior diálogo.

Assista ao pronunciamento de Salles:



"Eu entendo que o Brasil, ao longo desse ano e no ano que vem, na inserção internacional e também na agenda nacional, precisa ter uma união muito forte de interesses, de anseios e de esforços. E para que isso se faça da maneira mais serena possível, eu apresentei ao senhor presidente o meu pedido de exoneração, que foi atendido e eu serei substituído pelo secretário Joaquim Álvaro Pereira Leite, que também tem muita experiência e conhece todos esses assuntos", afirmou.

Salles também fez um balanço de seus dois anos e meio de gestão, destacando que buscou cumprir a orientação do presidente em equilibrar o desenvolvimento econômico com o meio ambiente, com respeito ao setor privado, ao agronegócio e aos empresários.


Entre as medidas citadas pelo ex-ministro, estão a aprovação do Marco Legal do Saneamento Básico, o programa Lixão Zero, o programa de concessões de parques nacionais e a abertura de concurso para o Ibama e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Ele também mencionou o programa Adote um Parque, que prevê a obtenção de recursos de empresas para a preservação de florestas.

Saída do ministério gera dúvida sobre foro dos processos contra Salles

No dia 17 de junho, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão de todos os processos em trâmite na Justiça Federal do Pará e do Amazonas relativos à Operação Handroanthus, que investiga a comercialização de madeira extraída ilegalmente na Amazônia.

A decisão foi tomada no âmbito do Inquérito (INQ) 4871, que tem como alvo de investigação o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e o presidente afastado do Ibama, Eduardo Bim, pelo suposto cometimento dos crimes de obstrução à fiscalização ambiental, embaraço das investigações e advocacia administrativa. Com a saída de Salles do Meio Ambiente, o STF terá que decidir para que vara da Justiça Federal envia as investigações, pois ao menos em tese a prerrogativa de foto deixa de existir.


A ministra atendeu pedido da Polícia Federal para que as investigações sejam concentradas no Supremo. Segundo a PF, a submissão da investigação Handroanthus à Justiça Federal esvazia a jurisdição do STF, órgão competente para atuar no feito, diante da conexão dos fatos investigados com a notícia-crime apresentada contra agentes políticos com foro por prerrogativa de função. O pedido aponta ainda a existência de decisões favoráveis aos investigados, determinando a restituição de instrumentos (maquinários) e produtos de crime (madeira ilegal), ignorando a existência de prova técnica sobre a origem.

Cautela judicial

Para a ministra Cármen Lúcia, em razão da cautela judicial necessária demonstrada pela Polícia Federal e para preservar a prova dos fatos investigados, essencial ao andamento das apurações que tramitam no STF, é imprescindível e proporcional, no momento, o sobrestamento imediato dos processos em trâmite nos juízos da 4ª Vara Federal do Pará e da 7ª Vara Federal do Amazonas.

Na avaliação da ministra, os fatos narrados pela autoridade policial são gravíssimos e têm potencial para prejudicar eventual resultado da apuração em trâmite no Supremo, pois os produtos dos crimes investigados, que estariam sendo restituídos prematuramente, têm relação direta com as pessoas sob investigação.

Ao sobrestar os processos, a ministra veda a tomada de novas decisões pelos juízos federais sem prévia autorização do Supremo, mesmo em regime de urgência, e suspende a eficácia de decisões que autorizaram a devolução de bens objeto das práticas investigadas no INQ 4871, até que a Corte analise e decida a matéria.

No dia 2 de junho, a ministra Cármen Lúcia determinara a instauração de inquérito contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Sales, pela suposta prática dos delitos de advocacia administrativa, obstar ou dificultar a fiscalização ambiental e impedir ou embaraçar a investigação de infração penal que envolva organização criminosa. A ministra atendeu a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) formulado na Petição (PET) 9595.

Operação Handroanthus

a PGR, circunstâncias relativas à suposta ocorrência de práticas delituosas expostas na Operação Handroanthus, da Polícia Federal, que resultou na apreensão de cerca de 200 mil metros cúbicos de madeira extraídos ilegalmente por organizações criminosas, tornam indispensável o aprofundamento da investigação.

Notícia crime

Ao deferir o pedido, a ministra observou que os fatos narrados, em tese, e conforme destacado pelo Ministério Público, podem configurar práticas delituosas e precisam ser investigados, a fim de apurar a veracidade e a autoria dos eventos mencionados na notícia crime veiculada pelo delegado de Polícia Federal Alexandre Silva Saraiva.

Diligências

Cármen Lúcia deferiu, ainda, as diligências requeridas pelo Ministério Público para a oitiva dos proprietários rurais e dos agentes de fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Departamento de Polícia Federal relacionados à operação, a requisição de cópia digitalizada da integralidade dos procedimentos de fiscalização e investigação relativos aos ilícitos ambientais e a inquirição de Ricardo Salles na condição de investigado. A PF terá 30 dias para concluir as diligências.

Arquivamento

Também em acolhimento à manifestação da PGR, a relatora determinou o arquivamento da notícia crime em relação ao senador Telmário Mota (PROS), por falta de provas. Ela salientou que o pedido nesse sentido é irrecusável, mas que, segundo o Código de Processo Penal (artigo 18), o arquivamento por ausência de provas suficientes não impede novo pedido de investigação, se vierem a surgir novos indícios sobre os fatos descritos na peça examinada pelo Ministério Público.



Agência Brasil e Supremo Tribunal Federal

Ricardo Salles Meio Ambiente boiada inquéritos no STF

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