Depois de se negar a responder a uma carta da CPI da Pandemia a respeito e manter silêncio por duas semanas sobre a denúncia de irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin, o presidente Jair Bolsonaro admitiu em entrevista à Rádio Gaúcha o encontro com o deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o irmão dele, o servidor do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda. Em tom irritado, Bolsonaro admitiu ao repórter que o parlamentar "pediu uma audiência para conversar sobre vários assuntos" pediu uma reunião com ele em Brasília. O presidente, entretanto, não confirmou o local ou o teor do encontro. A entrevista foi pouco antes de deixar Bento Gonçalves, em direção a Porto Alegre, na manhã deste sábado.
Em depoimento à CPI da Pandemia, o servidor público Luis Ricardo Fernandes Miranda, ao lado do irmão deputado, denunciou pressões de superiores para aprovar a compra da vacina da Covaxin, apesar de identificar irregularidades no processo de ao lado do irmão deputado. Luis Miranda, do DEM do Distrito Federal, contou aos senadores ter tido um encontro no dia 20 de março, um sábado, com o presidente, no Palácio Alvorada. Na conversa, de acordo com o parlamentar, Bolsonaro teria sido informado das pressões para fechar o negócio, com preços bem acima dos demais imunizantes e da própria oferta, meses antes, da própria fabrica indiana, a Bharat Biotech.
No depoimento à CPI, o deputado afirmou ter ouvido Bolsonaro classificar a denúncia levada a ele sobre as ressões para compra como 'mais um rolo daquele deputado'. Ao final do interrogatório, cobrado pela senadora Simone Tebet (MDB-MS), Miranda admitiu que Bolsonaro teria feito menção ao líder do Governo na Câmara, o ex-ministro da Saúde Ricardo Barros (PP).
Bolsonaro evitara a imprensa em toda a agenda de sexta-feira em Caxias do Sul. Nesta manhã, o presidente fez questão de parar para responder perguntas, antes de deixar Bento Gonçalves. Na véspera, o deputado Paulo Pimesenta, da bancada gaúcha do PT, anunciara no Twitter que circulava por Brasília uma gravação a conversa de 50 minutos entre os Irmãos Miranda e o presidente.
"Não me reuni. Ele pediu uma audiência para conversar comigo sobre vários assuntos. Cara, você vai ouvir o que eu quero falar. Eu não respondo sobre reunião. Eu tenho reunião com cem pessoas por mês, dos assuntos mais variados possíveis. Eu não posso simplesmente, ao chegar qualquer coisa pra mim, tomar providência imediatamente. Tomei providência depois," argumentou.
Questionado pelo repórter Eduardo Mattos sobre a compra da Covaxin, o presidente restrucou, em voz alta: "Gastamos um centavo com a Covaxin? Me responda: eu gastei um centavo? Além dos filtros do Ministério da Saúde, você tem o compliance nosso, tem a CGU (Controladoria-Geral da União) tem o TCU (Tribunal de Contas da União) e tem eu no final da linha, que só compra passando pela Anvisa."
Ouça no podcast do Eu, Rio! (eurio.com.br) a íntegra da entrevista de Bolsonaro à Rádio Gaúcha, em que admite de público o encontro com os Irmãos Miranda, mas evita responder sobre as acusações ao líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros.
Presidente tacha de 'bandidos' trio da CPI da Pandemia: Aziz, Randolfe e Renan
Bolsonaro alegou ainda que a compra da Covaxin, divulgado pela CPI da Covid, é "uma história fantasiosa" e que só interessa aos senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), presidente e vice-presidente da CPI, respectivamente, e Renan Calheiros (MDB-AL), relator da comissão.
"A compra seria 400 milhões de doses. A compra seria mil por cento sobre o faturamento. Não é a imprensa, é o que a CPI andou falando. Superfaturamento: mil por cento. Dos 15 dólares, passou para 150 dólares. Você multiplica 400 milhões de doses, vezes 150 dólares, vezes 5 reais. Isso dá 300 bilhões de reais. Isso é um coisa absurda, pelo amor de Deus. Eu assinei uma MP (Medida Provisória) de 20 bilhões para comprar vacina para todo mundo. É uma história fantasiosa. Só serve a Renan Calheiros, só serve a Omar Aziz ou aquele deputado [senador] Randolfe lá do Estado dele, não é nada isso aí!,"arrolando cifras que não foram levantadas pela CPI ou pela imprensa desde o início do caso.
Os três senadores citados assinaram, na última quinta-feira, uma carta endereçada a Bolsonaro. No texto, eles cobram que o presidente confirme ou desminta as declarações feitas pelos irmãos Miranda sobre o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR). "Eu não vou responder. Eu não tenho obrigação de responder, ainda mais carta para três bandidos. Eu vou responder para ladrões, bandidos? Eu não vou responder." Chegou a usar uma expressão vernacular, mas chula, para ilustrar seu desprezo pela cobrança dos senadores: "Caguei pra CPI!"
Mais tarde, em Porto Alegre, no discurso para apoiadores reunidos para uma motociata pela capital gaúcha, o detalhou os argumentos e alegou que a compra da vacina indiana Covaxin, do laboratório Bharat Biotech, foi suspensa devido a controles governamentais. A afirmação foi feita durante discurso em Porto Alegre, ao final da motociata com apoiadores, de acordo com o relato da Agência Brasil.
“Dois anos e meio sem corrupção. Querem agora imputar um crime a mim de corrupção, onde uma dose sequer foi comprada da vacina”, disse o presidente. “Porque temos filtro, temos controle”.
No fim de junho, o Ministério da Saúde suspendeu temporariamente o contrato de compra da vacina indiana, por orientação da Controladoria-Geral da União (CGU), dias depois de depoimentos à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia dados pelo deputado Luís Miranda (DEM-DF) e de seu irmão, chefe de importação do Ministério da Saúde, Luís Ricardo Miranda.
O chefe de importação do ministério relatou pressões atípicas para a contratação da Covaxin e problemas no processo de importação, como a tentativa inicial de pagamento adiantado de US$ 45 milhões e o uso de uma empresa que não estava listada no contrato.
Rádio Gaúcha, Correio Braziliense e Agência Brasil